Paleontologia na sala de aula

Que criança não gosta de dinossauros? E que professor do ensino fundamental e médio nunca passou aperto por não saber responder uma ‘daquelas’ perguntas de seus alunos sobre fósseis? Ainda, quem já não teve uma enorme dificuldade em encontrar uma fonte segura que pudesse ser consultada de forma gratuita e fácil, para saciar a sua curiosidade sobre informações básicas dos animais e plantas que há milhares de anos viveram no nosso planeta? Para fazer frente a algumas dessas perguntas, foi elaborado o projeto do livro digital A paleontologia na sala de aula. Lançada no início de agosto, a publicação já ultrapassou 10 mil acessos.

Há bastante tempo os pesquisadores brasileiros observam que a paleontologia – ramo da ciência que se preocupa com a pesquisa dos vestígios da vida preservados nas rochas com mais de 12 mil anos – não está sendo ministrada de forma adequada nas escolas. Os problemas são muitos e os principais já conhecidos por todos nós, uma vez que afetam igualmente todo ensino de ciências: falta de professores, profissionais mal preparados e desestimulados. No caso da paleontologia, a situação é ainda mais complexa pela especificidade da matéria. A maioria das pessoas já ouviu falar nos fósseis, mas pouco sabe a respeito deles. Não é incomum que muitos pensem que praticamente todo vertebrado preservado nas rochas seja um dinossauro. Até mesmo as preguiças gigantes que se encontram montadas em diversas instituições como o Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro e que viveram há cerca de 12 mil anos são confundidas com dinossauros.

A partir de reuniões de paleontólogos, um grupo de especialistas pensou que poderia se tentar mitigar um pouco a situação utilizando a tecnologia digital, cada vez mais acessível. Inicialmente, pensou-se em uma página on-line que reunisse uma variedade de textos em língua portuguesa para a divulgação da paleontologia. Isso foi há quase seis anos… De lá para cá, a ideia evoluiu a partir da contribuição de diversos pesquisadores e educadores, que dividiram as suas experiências. Ao final, chegou-se ao livro digital, com textos e dezenas de imagens coloridas.

Tafonogame: o Jogo da Fossilização
Parte do tabuleiro da atividade “Tafonogame: o Jogo da Fossilização”. (imagem: Voltaire Dutra Paes Neto)

Organizado pela paleontóloga e pesquisadora Marina Bento Soares, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), o livro foi editado com muito zelo pela Editora Imprensa Livre e financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) a partir de um projeto outorgado à paleontóloga Ana Maria Ribeiro, da Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul. O apoio fundamental para que esse projeto se tornasse realidade foi da Sociedade Brasileira de Paleontologia, atravessando três gestões, respectivamente de João Carlos Coimbra (UFRGS), Roberto Iannuzzi (UFRGS) e Max Cardoso Langer (Universidade de São Paulo, campus Ribeirão Preto).

Teoria e prática

Como fica bem claro logo de início, o livro é dividido em duas partes principais. A primeira, sob o título “Referencial teórico”, possui 22 capítulos que falam sobre diversos aspectos da paleontologia, desde como se formam os fósseis e os continentes, até as técnicas de preparação e confecção de réplicas de fósseis. A segunda parte, englobada como “Práticas em sala de aula”, apresenta 58 atividades que podem ser utilizadas pelos professores e outras pessoas interessadas. Todas são muito interessantes: como exemplo, podemos citar uma que fala do tempo geológico, outra em que se procura passar noções de como os organismos se tornam fósseis, sem contar com a cruzadinha paleopatológica!

Dinossauro em arame
Amostra de etapa da atividade “Dinossauros em arame: da anatomia à biomecânica”. (imagem: Tito Aureliano)

Ao todo, o projeto envolveu nada mais nada menos do que 71 autores, entre alunos, pesquisadores e educadores dos mais diferentes pontos do país. Para todos os exercícios e desafios com perguntas existem respostas que – vejam só – não estão no site. Apenas os professores podem obtê-las pelo e-mail [email protected]. A ideia é que os alunos tentem por si só e não ‘colem’ para responder ou solucionar as perguntas e atividades.

No meio de tantas notícias ruins que têm assolado o nosso país, dá gosto ver uma iniciativa como esta. Parabéns à colega Marina e à Karla Viviane, da Editora Imprensa Livre, por essa enorme contribuição! Vou já entrar na página e jogar um dos joguinhos para saber se o meu conhecimento sobre fósseis ainda está atualizado…

Alexander Kellner
Museu Nacional/UFRJ
Academia Brasileira de Ciências

 

Paleocurtas

As últimas do mundo da paleontologia
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Acaba de acontecer o XXIV Congresso Brasileiro de Paleontologia. Organizado pela Universidade Regional do Cariri, no Crato (CE), o evento foi um grande sucesso, contando com diversos mini-cursos e sessões técnicas, além de uma mesa-redonda sobre o problema do tráfico de fósseis na região. A exibição do documentário Peixeiros foi bastante reveladora da ação de servidores de autarquias federais que deveriam zelar pela proteção dos depósitos fossilíferos. Em breve, todos os vídeos do congresso estarão disponíveis na página da TV Natureza Cariri. Parabéns ao colega Antônio Álamo Feitosa Saraiva, presidente do evento, e aos demais colegas da comissão organizadora!

Falando em congressos, está em pleno andamento a organização do simpósio sobre pterossauros, que será realizado em Portsmouth, Inglaterra, de 15 a 29 de agosto. Este evento, o sétimo dedicado à pesquisa desses répteis voadores que foram os primeiros vertebrados a desenvolver o voo ativo, contará com workshops e atividade de campo, além, claro, de apresentações técnicas (oral e pôster), apresentando as mais novas descobertas referente a esses animais alados. Mais informações aqui.

Um interessante estudo realizado em rochas formadas há aproximadamente 290 milhões de anos no estado do Kansas (Estados Unidos) revelou a existência de dezenas de perfurações. Segundo Thomas McCahon e Keith Miller (Kansas State University), essas aberturas foram feitas por peixes pulmonados que viveram nessa região, que deveria estar próxima a costa, com baixa topografia, possivelmente invadida pelo mar pelo menos durante parte do ano. A pesquisa foi publicada pela Palaeogeography, Palaeoclimatology, Palaeoecology.

Ainda sobre pterossauros, acaba de ser publicado um estudo coordenado por Xiaolin Wang (Institute for Vertebrate Paleontology and Paleoanthropology, Pequim, China), com participação deste colunista, que relata a descoberta de um pterossauro com dois ovos associados, um dos quais no interior do corpo do animal. Entre outros aspectos, esse estudo, publicado nos Anais da Academia Brasileira de Ciências, mostra que esses répteis alados possuíam dois ovidutos funcionais, ao contrário do que se observa nas aves.

Jessica Whiteside (University of Southampton, Southampton, Inglaterra) e colegas publicaram na PNAS um estudo sobre as variações ecológicas dos primeiros 30 milhões de anos do surgimento dos dinossauros. A conclusão foi surpreendente: enquanto esses répteis dominavam áreas situadas em maiores latitudes, onde as condições ecológicas eram favoráveis, eram escassos em regiões de menor latitude, onde as condições ecológicas eram instáveis e extremas.

Marouf Abdelhamid (Ain Shams University, Cairo, Egito) e colegas acabaram de revisar a fauna de equinoides (também conhecidos como ouriços-do-mar) encontrada em rochas cretáceas do Oriente Médio de da Península Arábica. O estudo, publicado na Cretaceous Research, revelou que esses invertebrados eram bem mais diversificados do que se supunha.