A um passo das estrelas

A sonda espacial Voyager 1 já era o objeto de criação humana mais distante da Terra. Agora, ela está a um passo de completar a incrível façanha de sair do Sistema Solar e chegar ao espaço interestelar, zona habitada por estrelas, aonde a luz do nosso Sol não chega.

A Voyager 1 e sua irmã gêmea, a Voyager 2, foram lançadas no espaço pela Nasa, a agência espacial norte-americana, há 33 anos com o intuito de explorar o Sistema Solar. Desde então, continuam funcionado e diariamente trocam dados com a Terra.

A Voyager 1 deve ultrapassar essa última barreira daqui a três ou quatro anos

Desde o ano passado, as sondas movem-se por uma região chamada de helioheath, onde os ventos solares, formados por partículas elétricas emanadas do Sol, têm velocidade reduzida. Essa zona é o último obstáculo antes da fronteira – chamada de heliopausa – que separa o nosso Sistema Solar do pouco conhecido espaço interestelar.

Em conferência de imprensa no dia 28 de abril, pesquisadores associados à Nasa anunciaram que a Voyager 1 deve ultrapassar essa última barreira daqui a três ou quatro anos.

“Nossos modelos anteriores previam que iria demorar muitos anos, mas a Voyager 1 está detectando uma velocidade quase zero de vento solar, então parece que estamos em uma região muito perto da heliopausa”, diz à CH On-line a astrofísica brasileira Merav Opher, integrante do projeto da Voyager e professora da Universidade de Boston (EUA).

Escute o som dos ventos solares captado pela Voyager 1:

(Vídeo: Nasa/JPL/University of Iowa)

 

Surpresas à beira do Sistema Solar

Apesar de a sonda já estar nessa região desde 2010, somente agora os cientistas conseguiram concluir a análise dos primeiros dados enviados por ela. Para se ter uma ideia, são necessárias 16 horas para que um comando enviado da Terra chegue até a sonda e a mesma quantidade de horas para que a resposta da sonda retorne.

Os primeiros dados mostram que a helioheath é uma área mais complexa do que se imaginava, com temperatura mais baixa do que o esperado e ventos muito leves. “Não sabemos por que essa região é desse modo, mas achamos que a energia dos ventos solares deve ter ido para outro lugar”, afirma Opher.

Para compreender melhor a dinâmica dessa região, a Voyager 1 realiza manobras a cada três meses à procura de ventos solares com diferentes velocidades. Conhecer o padrão de movimentação desses ventos ajuda os cientistas a definirem, de modo mais preciso, a forma da “bolha” em que nosso Sistema Solar está inserido, a heliosfera.

“É provável que nem tão cedo consigamos entender como se dá a relação entre os ventos solares da heliosfera e o espaço interestelar”, ponderou o astrônomo Edward Stone, do Laboratório de Propulsão da Nasa, em comunicado à imprensa.

Sondas Voyager no Sistema Solar
A ilustração mostra o formato do Sistema Solar e a posição das duas sondas Voyager, que estão na região chamada de ‘helioheath’. (imagem: Nasa/JPL-Caltech)

Segundo o cientista, essa lacuna de conhecimento sobre a fronteira do Sistema Solar pode fazer com que os pesquisadores nem percebam quando a sonda cruzar sua última barreira. “Acho que, quando o momento chegar, ainda vamos ficar uns dois anos debatendo se a sonda chegou ou não ao final da heliosfera.”

O que há do outro lado?

A Voyager 1 conseguirá as primeiras medições diretas do espaço interestelar. Com esses dados, os cientistas poderão caracterizar essa região do espaço e analisar partículas que nunca sofreram influência do Sol.

“Nunca ultrapassamos uma barreira como essa, então não sabemos direito o que encontrar”, diz Merav Opher. A astrofísica explica que o espaço interestelar deve ser um ambiente frio e rarefeito e com composição química muito diferente.

A maior expectativa dos cientistas é medir a composição de elementos leves que podem estar presentes nessa região do espaço e que seriam peças-chaves para a compreensão dos modelos de evolução da galáxia. Opher enfatiza: “Estamos ansiosos esperando os dados da Voyager!”

Alô, alô, extraterrestre!
Disco com sons da TerraCom a interrupção temporária do Projeto Seti, que procura vida extraterrestre, as sondas Voyager passam a ser o instrumento mais importante dessa busca. Cada uma delas carrega um disco de metal coberto de ouro (foto), semelhante aos antigos vinis, em que foram gravados 90 minutos de música terráquea, uma faixa com sons da Terra – que vão desde o latido de um cachorro até o borbulhar de uma panela fervendo água – e frases de boas-vindas em 55 idiomas.
O objeto, idealizado pelo astrônomo e escritor de ficção científicanorte-americano Carl Sagan (1934-1996), foi pensado como um cartão devisitas da Terra para alguma forma de vida inteligente que possa cruzaro caminho das sondas. Sobre a superfície dos discos há desenhos queapontam a sua origem e ensinam como eles devem ser usados.


Sofia Moutinho

Ciência Hoje On-line