Absorção em baixa

A mata atlântica conserva hoje menos de 16% de sua área original de pé. Em aproximadamente 1/3 deste território, porém, ela é preservada em fragmentos de até 100 hectares, geralmente afastados mais de um quilômetro uns dos outros. Segundo um estudo realizado por pesquisadores brasileiros e alemães, essa fragmentação da mata reduz a absorção de carbono pela floresta e compromete a biodiversidade.

A formação de bordas ocasionada pelo desmatamento (ou seja, as áreas limítrofes entre a mata prevalecente e aquelas abertas pelo homem no entorno, geralmente para uso agrícola) acaba expondo mais a vegetação, e assim partes da mata que concentravam maior biomassa ficam mais suscetíveis à destruição. O grande problema é que a regeneração nas zonas fracionadas é ainda mais difícil.

Essas conclusões foram apresentadas em artigo publicado na Ecological Modelling, elaborado por pesquisadores do Centro Helmholtz para Pesquisa Ambiental (UFZ), da Alemanha, e do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP), entre outras instituições. Durante nove anos, eles analisaram áreas fragmentadas de mata atlântica em Ibiúna (SP), que serviram de base para um programa de simulação do crescimento da floresta.

O banco de dados reúne informações sobre as espécies, números de plantas, altura e características ecológicas de mais de sete mil árvores, a fim de avaliar como essa mata se comportaria nos próximos 400 anos. 

Trecho de mata fragmentada no Mato Grosso
Os danos causados pela fragmentação se aplicam a qualquer tipo de floresta, como esta no noroeste do Mato Grosso, com áreas de bordas delimitando o terreno que serve ao plantio de algodão (foto: Pedro Biondi/ Agência Brasil).

O sistema já era usado em florestas da Indonésia, mas foi adaptado para incluir características específicas da mata atlântica brasileira, em particular relacionadas à influência de fatores externos e internos em seu desenvolvimento. Dentre os efeitos causados pelo desmatamento nas matas remanescentes estão uma maior mortalidade das árvores grandes, mudanças na composição da vegetação, aumento da quantidade de cipós e alterações na dinâmica do carbono.

No clima, essas alterações se refletem no agravamento do efeito estufa

Comparado às matas contínuas, a absorção de carbono naquelas fragmentadas acaba sendo menor por causa da alteração do ecossistema e da perda de espécies. As áreas de borda são compostas por árvores tolerantes à maior incidência de luz e vento, mas estas têm menor potencial de absorção do carbono.

Estima-se que um fragmento de um hectare (equivalente a um campo de futebol), essencialmente composto por áreas de borda, absorva 40% menos carbono atmosférico do que a mesma área de mata intacta. Segundo o biólogo Jean Paul Metzger, professor do Instituto de Biociências da USP e um dos autores do estudo, isso  denota a reduzida capacidade dessas matas de amenizarem os efeitos do aquecimento climático provocado pela emissão de gases de efeito estufa na atmosfera.

Ou seja, essas alterações agravam ainda mais o efeito estufa, considerando-se que 20% do total das emissões globais de CO2 são originárias da destruição da floresta.

 

Menor biodiversidade e capacidade de regeneração

Metzger explica que a biomassa também se reduz essencialmente devido à criação de bordas nas matas. “O que acontece é que as áreas centrais, cuja biomassa é maior, ficam expostas às perturbações externas com a ação do desmatamento”, conta. No futuro, a mata que antes ficava no centro da floresta vai para a sua borda, e assim há um ciclo redutor da biomassa e da biodiversidade. 

A regeneração em matas fracionadas é mais demorada que nas contínuas

A regeneração em matas fracionadas é muito menos intensa que nas contínuas, e por isso é necessário estimular o agrupamento dessas áreas. “A criação de áreas de borda tem que ser evitada”, defende Metzger. “No caso da mata atlântica, devemos estimular a restauração em propriedades privadas, de modo a agrupar as reservas legais, criando fragmentos grandes ou expandindo os já existentes”, completa.

Metzger afirma ainda que esses danos não são causados apenas à mata atlântica, mas podem afetar qualquer floresta – como já alertara em outra reportagem da Ciência Hoje. Essa destruição está associada à expansão de pastagens, plantações e áreas urbanas, o que afeta diversas regiões do Brasil e do mundo. Para especialistas, é fundamental que diversos setores da sociedade se articulem com o objetivo comum de proteger a floresta e garantir o desenvolvimento sustentável do país.

Larissa Rangel
Ciência Hoje On-line