Daqui a 50 anos, é possível que haja uma nova carreira: a de engenheiro quântico. Este profissional dominaria a tal ponto os conhecimentos de mecânica quântica que seria capaz de utilizá-los para criar dispositivos como, por exemplo, sensores hiperprecisos de movimento, capazes de auxiliar na direção automática de carros.
“A engenharia quântica será no futuro o que a elétrica é para nós hoje. Um rádio é um dispositivo mundano atualmente, mas nem sempre foi assim”, afirma o autor da previsão, o físico austríaco Peter Zoller [PDF], da Universidade de Innsbruck, na Áustria.
Zoller foi um dos convidados internacionais da Primeira Escola de Ciência Avançada de Spintrônica e Computação Quântica, que aconteceu semana passada no Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da Universidade de São Paulo (USP).
O evento tem como objetivo fomentar a internacionalização da ciência brasileira nessa área, não só expondo doutorandos e pós-doutores a expoentes estrangeiros desse campo, como também trazendo estudantes de outros países para conhecer o trabalho de pesquisadores nacionais.
“Queremos desmistificar essa questão da cooperação internacional, que aqui ainda é muito incipiente, e mostrar para os jovens físicos brasileiros que para ter impacto, escrever e publicar bons artigos é preciso se associar a pesquisadores de alto nível”, ressalta Carlos Egues, físico do IFSC e coordenador da escola.
Nascida de gigante
Assim como a eletrônica se vale do fluxo de elétrons, a spintrônica usa uma propriedade dessa partícula chamada spin. “É como se o elétron fosse uma pequena bússola cuja agulha pode apontar para o norte ou para o sul. Esses dois estágios seriam as duas formas do spin: para ‘cima’ ou para ‘baixo’”, explica Egues.
A spintrônica nasceu da descoberta do efeito de magnetoresistência gigante, que rendeu o Nobel de Física de 2007 para outro participante da escola, o alemão Peter Grünberg. Sua descoberta permitiu a criação de discos rígidos pequenos capazes de armazenar mais dados, abrindo caminho para uma nova geração de dispositivos eletrônicos portáteis.
Diferentes e similares
Na escola, os participantes estão discutindo a relação entre essa e outra área de fronteira – a computação quântica. Nesta, o paradigma padrão de um bit (a unidade de informação computacional), pelo qual ele é representado por 1 ou zero, pode ser expandida pela utilização de mecanismos quânticos.
Assim, um bit quântico (qubit) não estaria limitado a um dos dois estados, podendo mesmo representar 1 e zero ao mesmo tempo.
“Atualmente acredita-se que o spin possa ser um candidato a qubit”, conta o coordenador da escola.
Para Zoller, ainda não há nada útil, no momento, em termos de dispositivos. Ele crê que levará tempo para que as pesquisas deem resultados práticos. Mas ele acha que o evento é importante.
“Os vários pesquisadores reunidos aqui são de áreas distintas, mas possuem muitas similaridades”, comenta. “É uma discussão bastante interdisciplinar, cujos tópicos ajudarão a definir a direção das próximas pesquisas e, no futuro, serão a base da engenharia quântica”.
Zoller acrescenta: “Além disso, este evento é importante para o Brasil, pois o futuro do país depende dos jovens pesquisadores, eles devem se interessar por essa área e ajudar a tornar sua nação uma das potências desse campo”.
Fred Furtado (*)
Ciência Hoje/RJ
(*) O repórter viajou a São Carlos a convite da Primeira Escola de Ciência Avançada de Spintrônica e Computação Quântica, realizada com o apoio da Fapesp