Homenagem ao multiculturalismo

 

Jean-Marie Le Clézio, Nobel de Literatura de 2008 (foto: E. Feferberg – EPA/Scanpix).

O autor francês Jean-Marie Gustave Le Clézio foi o ganhador do Nobel de Literatura deste ano. Considerado por alguns o maior escritor francês vivo, Le Clézio contempla em suas obras diversas culturas não hegemônicas e trata do mundo globalizado a partir de uma perspectiva itinerante, de quem viveu em vários países.

No anúncio do prêmio, a Academia Sueca apresentou Le Clézio como um “autor de novas saídas, aventura poética e êxtase sensual” e “explorador de uma humanidade além e abaixo da civilização reinante”. Embora abstrata, a justificativa pode ser atribuída em parte à busca do escritor por conhecer e retratar diferentes sociedades espalhadas pelo mundo.

Desde a infância, quando seu pai serviu como médico na Nigéria durante a Segunda Guerra Mundial, Le Clézio percorreu diversos países, o que lhe permitiu ter um olhar próximo e atento à cultura de vários povos. O escritor estudou na França e na Inglaterra e tornou-se professor em universidades da Tailândia e dos Estados Unidos. Seu primeiro livro publicado foi Le procès-verbal (1963), que deu início a uma série de obras que tratam de crises sociais.

“Le Clézio está sendo cotado para o Nobel há muito tempo. A obra dele é bastante diversificada. O mito e a utopia estão presentes desde o primeiro livro, mas a realidade contemporânea também”, diz à CH On-line a especialista em literatura Ana Luiza Silva Camarani, da Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara da Universidade Estadual Paulista (Unesp).

Segundo Camarani, que coordena um projeto de pesquisa sobre a obra ficcional do autor francês, os livros de Le Clézio tratam dos problemas trazidos pela globalização, questões presentes no mundo em que vivemos. “Ele escreve sobre diversas raças, focalizando aquelas que vivem à margem da cultura hegemônica”, complementa.

Experiência transformadora

O Africano e Peixe dourado, dois dos livros de Le Clézio lançados no Brasil, pela CosacNaify e pela Companhia das Letras, respectivamente.

No período de 1970 a 1974, o escritor viveu no México e na América Central e teve três anos de contato direto com índios, experiência que rendeu o livro Voyage de l’autre cote(1975) e a tradução de duas obras da tradição indígena. O livro Haï

(1971) também tem fortes influências da cultura dos índios.

 

“As primeiras obras de Le Clézio são extremamente racionais até o momento em que ele convive com os índios. O próprio escritor diz que foi um choque físico que fez com que sua literatura seguisse outro caminho e se diversificasse muito mais, abordando aspectos diferentes”, conta Camarani.

 

Segundo ela, Le Clézio não é visto como um escritor para o grande público. Entre suas mais de 40 obras, seis foram publicadas no Brasil, entre elas Em busca do ouro, O Africanoe O Deserto.

Este último, seu livro mais premiado, descreve uma cultura perdida em um deserto no norte da África em contraste com a Europa vista pelos olhos de imigrantes não desejados.

 

O autor francês escreve poeticamente, mesmo em seus contos. Quanto ao conteúdo de suas obras, além do multiculturalismo, do exílio e de suas memórias – muitas delas da própria família –, Le Clézio aborda o mundo da infância e da juventude, público para o qual também escreveu contos e livros, como Voyage au pays des arbres(1978). Uma reunião de todos esses temas freqüentes em seus escritos é feita em Révolutions(2003). O livro mais recente do escritor é Ritournelle de la faim,

publicado em 2008. 

 

 

Tatiane Leal
Bernardo Esteves 

Ciência Hoje On-line

09/10/2008