A técnica utilizada para tratar a infertilidade humana, que acomete mais de 10% da população mundial, garantiu o prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina para seu criador, o fisiologista inglês Robert Geoffrey Edwards, aos 85 anos.
Ele foi o principal responsável pela criação da fertilização in vitro humana, método pelo qual os óvulos podem ser fecundados fora do útero para depois serem reimplantados e levarem a uma gravidez normal. As crianças nascidas por este método são popularmente conhecidas com ‘bebês de proveta’.
Desde os anos 1950, Edwards pesquisava a biologia da fecundação. Como outros cientistas já haviam obtido sucesso com fertilização in vitro em coelhos, o fisiologista investigou se esses métodos poderiam se aplicar a humanos.
O trabalho de Edwards com vários colaboradores esclareceu como os óvulos humanos amadurecem, o momento certo de fertilizá-los, os hormônios que regulam o processo e como o esperma é ativado.
Laparoscopia para chegar ao óvulo
Em 1969, Edwards conseguiu a primeira fertilização in vitro de um óvulo humano. No entanto, o zigoto produzido só se dividia uma vez, formando duas células. Para conseguir um embrião viável, o fisiologista teorizou ser necessário um óvulo que houvesse amadurecido no ovário, mas as técnicas usadas então não permitiam a extração direta de óvulos do corpo humano.
Foi então que Edwards ficou sabendo do trabalho do médico inglês Patrick Christopher Steptoe (1913-1988), pioneiro da laparoscopia, técnica que permite visualizar o sistema reprodutivo feminino por meio de um endoscópio de fibra óptica. Edwards percebeu o potencial do método para extrair óvulos e os dois começaram uma colaboração.
Extraídos por laparoscopia através de uma incisão na região do umbigo e fecundados com espermatozóides na placa de Petri (e não em uma proveta, como o nome popular sugere), os óvulos se dividiram em oito e 16 células, comprovando o sucesso da técnica.
A partir daí, os dois pesquisadores passaram a reimplantar os óvulos fertilizados nas pacientes. Foram muitos anos de tentativas até que, em 25 de julho de 1978, nasceu a inglesa Louise Joy Brown, o primeiro bebê ‘de proveta’ do mundo.
No Brasil, o primeiro nascimento resultante de fertilização in vitro ocorreu em 7 de outubro de 1984, em São José dos Pinhais (PR). Anna Paula Caldeira, o bebê ‘de proveta’ nacional, nasceu graças à fertilização in vitro realizada pelo médico Milton Nakamura (1933-1997), pioneiro da técnica no país.
Quatro milhões e contando
Para o médico especializado em reprodução Luiz Fernando Dale, responsável pelo primeiro bebê de ‘proveta’ carioca, o prêmio é merecido, e chega atrasado. “Edwards criou uma revolução na medicina reprodutiva há 33 anos. Seu trabalho possibilitou o nascimento de cerca de quatro milhões de pessoas”, conta.
Assim como as células-tronco embrionárias hoje, a fertilização in vitro gerou muita discussão ética na época em que foi descoberta. A necessidade de agir com rigor ético era defendida pelo próprio Edwards.
Ele chegou a escrever um artigo com seu advogado reiterando que pesquisas na área deveriam ser conduzidas sob as mais estritas diretrizes éticas, e mantinha um comitê de ética na clínica reprodutiva que abriu com Steptoe (a Bourn Hall Clinic, na Inglaterra). Apesar de seus esforços, o fisiologista encontrou muita resistência ao seu trabalho, tanto de líderes religiosos quanto do governo e de cientistas.
A resistência não se restringiu aos anos 1970. Poucas horas após o anúncio, o Vaticano já reagiu com críticas, com a “perplexidade” expressa pelo monsenhor espanhol Ignacio Carrasco de Paula, presidente da Pontifícia Academia para a Vida.
Apesar de tudo, Edwards persistiu e a fertilização in vitro humana avançou bastante. Atualmente, de 2% a 3% dos recém-nascidos em vários países são concebidos por meio de reprodução assistida. “Ele mudou a maneira de encarar o problema da infertilidade”, declara Dale.
O prêmio dará a Edwards 10 milhões de coroas suecas, o equivalente a cerca de R$ 2,5 milhões.
Fred Furtado
Ciência Hoje/ RJ
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