Em frente a uma televisão de tela plana ligada a uma câmera digital e conectada à internet, Ayse Artúrk, de 59 anos, faz os seus exercícios diários orientada por Tom, que se encontra do outro lado do aparato. Ele faz os movimentos primeiro e depois observa a aluna. Em seguida, dá algumas instruções para melhorar seu desempenho.
Moradora de Doornakkers, na província Brabante do Norte, no sul dos Países Baixos, Ayse Artúrk é uma de 50 voluntários no projeto Living Lab (algo como ‘Laboratório em Casa’), coordenado pela empresa holandesa Brainport Development e cofinanciado pelo governo regional e a iniciativa privada.
O objetivo é testar a aplicação de produtos e serviços médicos desenvolvidos na região conhecida como Brainport – que engloba as cidades de Eindhoven, Leuven e Aachen e é uma das mais inovadoras da Europa – com a finalidade de melhorar a qualidade de vida de idosos que desejam viver independentemente, o maior tempo possível, em suas próprias casas.
“De que adianta a gente desenvolver uma série de tecnologias se elas não forem úteis ao seu público-alvo?”, questiona Peter Portheine, diretor de projetos no setor de saúde e tecnologia da Brainport Development, para explicar a lógica que move o Living Lab.
De um lado, o projeto oferece alternativas tecnológicas para beneficiar a saúde, aumentar a segurança e dinamizar as relações sociais dos participantes. De outro, espera dos potenciais usuários um retorno sobre a usabilidade, eficácia e aceitabilidade desses serviços.
Cotidiano futurista
O distrito de Doornakkers, que abriga uma comunidade predominantemente turca composta por um grande número de idosos, foi escolhido para a implementação da primeira fase do Living Lab, iniciada em setembro de 2010. Ali, todos os voluntários do projeto têm em casa equipamentos de ponta para os auxiliarem em seu dia a dia.
Por meio de televisões como a de Ayse, eles participam de um programa de condicionamento físico voltado às necessidades individuais e supervisionado por personal trainers.
Cada voluntário tem um perfil eletrônico onde todos os seus progressos são registrados, além de informações básicas sobre a sua saúde, como pressão arterial, batimentos cardíacos e peso. As medições são feitas diariamente por meio de sensores e enviadas pela internet.
Dos serviços oferecidos pelo Living Lab, o que Riet Dolmans, também voluntária no projeto, preza mais é a conexão direta com assistentes de saúde do centro médico local. Ela permite que Riet entre em contato com esses profissionais a qualquer hora do dia, seja para tirar dúvida ou apresentar uma queixa de saúde.
Já em situações de emergência, basta ela apertar um botão vermelho localizado em sua sala de estar para contatar imediatamente a polícia ou o hospital mais próximo. “Isso me deixa bastante segura”, afirma Riet, de 80 anos, 54 deles vividos em Doornakkers.
Apesar de ser holandesa, Riet está cada vez mais integrada à comunidade turca. Parte desse entrosamento ela deve também ao Living Lab, que considera a interação social um ingrediente fundamental para uma vida saudável.
Para fomentar essa interação, o projeto implantou uma rede social que conecta os moradores de Doornakkers. Por meio de computadores domiciliares de fácil interface, os voluntários podem se comunicar, em tempo real, por mensagem, voz e imagem.
As trocas, no entanto, não se restringem ao mundo virtual. No âmbito do Living Lab, os participantes se encontram com frequência, seja nas aulas de ginástica semanais ou nos clubes de xadrez e de outros hobbies.
Balanço positivo
Os resultados preliminares obtidos em Doornakkers são animadores. Em termos de saúde, por exemplo, observou-se uma redução significativa no peso dos voluntários, além de melhoras na pressão arterial e frequência cardíaca. Também houve ganhos relacionados a suas competências linguísticas.
Mas, para Peter Portheine, o melhor resultado até aqui é o elevado grau de adesão dos participantes. “Quase todo mundo que começou continua no projeto”, comemora. Na sua avaliação, a implementação cuidadosa das novas tecnologias tem garantido sua aceitabilidade por parte dos usuários finais.
O sucesso da fase piloto propiciou a expansão do Living Lab para outras comunidades. Atualmente, os distritos de Rapenland e Bennekel também integram o projeto, envolvendo cerca de 50 voluntários cada.
“O grande desafio agora é encontrar um modelo de negócio sustentável, onde todos os atores relevantes contribuam em consonância com as vantagens sociais e econômicas que almejamos”, analisa Portheine.
Carla Almeida*
Ciência Hoje On-line
* A jornalista viajou para os Países Baixos a convite do Ministério da Economia, Agricultura e Inovação do país.