Ajuda para interpretar o coração

Em tempos em que estudos interdisciplinares ganham cada vez mais importância, a engenharia se une à medicina para desenvolver novas ferramentas que ajudem a entender o corpo humano. Um dos frutos dessa união de forças é o ECGLab, software que auxilia cardiologistas a interpretar sinais do eletrocardiograma e permite analisar a influência do sistema nervoso sobre o funcionamento do coração.

O programa, desenvolvido durante o mestrado pelo engenheiro e professor da Universidade de Brasília (UnB) João Luiz Carvalho, funciona por meio de um computador conectado a um eletrocardiógrafo digital (aparelho utilizado em eletrocardiogramas). 

O ECGLab conta com seis módulos de análise complementares e interfaces gráficas que prometem dar mais rapidez e precisão aos diagnósticos médicos. O projeto foi desenvolvido sob a orientação dos professores Adson Ferreira da Rocha, da engenharia elétrica, e Luiz Fernando Junqueira Jr., da medicina.

Tela do programa ECGLab, que ajuda a interpretar eletrocardiogramas
Neste módulo, o programa faz a análise estatística do sinal de variabilidade da frequência cardíaca. O gráfico maior mostra a variação do intervalo entre batimentos consecutivos ao longo do tempo, enquanto o menor permite uma avaliação estatística da série de intervalos (imagem: reprodução).
Intervalos entre batimentos ajudam a medir a influência do sistema nervoso autônomo na variabilidade da frequência cardíaca

Trabalhando no projeto desde 2002, a equipe desenvolveu uma ferramenta capaz de utilizar os intervalos entre batimentos consecutivos para medir a influência do sistema nervoso autônomo na variabilidade da frequência cardíaca.

Enquanto o ramo simpático acelera o ritmo do coração, reduzindo o intervalo entre os batimentos, o parassimpático exerce influência inversa, diminuindo o ritmo e tornando os intervalos mais longos.

“O ECGLab permite a cardiologistas avaliar como o equilíbrio entre os sistemas nervoso simpático e parassimpático se altera quando o paciente é submetido a estímulos externos diferentes”, explica Carvalho. Dependendo do estado da pessoa — deitada, em pé ou correndo, por exemplo —, o sistema nervoso autônomo reage para adaptar o ritmo cardíaco à nova situação.

A análise da variabilidade da frequência cardíaca pode auxiliar médicos no diagnóstico de doenças nervosas e de deficiências no controle do sistema nervoso autônomo sobre várias funções do organismo. Por enquanto, o ECGLab ainda não é utilizado em exames clínicos, mas 54 grupos de pesquisa de todo o mundo (sendo 14 no Brasil) já o usam em estudos.

Tela do programa ECGLab, que ajuda a interpretar eletrocardiogramas
O gráfico de Poincaré permite avaliar a correlação entre intervalos consecutivos, a variabilidade a curto e longo prazos e a estatística das séries de intervalos curtos, médios e longos (imagem: reprodução).

Cooperação é a chave

O ECGLab é mais uma criação da engenharia biomédica, área que congrega conhecimentos de ciências exatas e da saúde. O software foi idealizado por professores da Faculdade de Medicina e desenvolvido no Departamento de Engenharia Elétrica.

Em 2001, João Luiz Carvalho desenvolveu o ECGCapt, software para aquisição e captura dos sinais de frequência cardíaca para computadores. No ano seguinte, deu início ao desenvolvimento do projeto ECGLab, com cinco módulos de análise.

“Muitos avanços na medicina foram conquistados graças ao trabalho conjunto entre engenheiros e profissionais de saúde”

A incorporação do sexto módulo ao projeto foi feita em parceria com a estudante de engenharia elétrica Fernanda Leite, depois da sugestão de um dos grupos que utiliza o ECGLab em pesquisas.

“A característica mais importante da engenharia biomédica é a interação entre engenheiros e profissionais de saúde”, aponta Carvalho. “Muitos avanços na medicina foram conquistados graças a esse trabalho conjunto. Espero dar continuidade à parceria para atualizar e modernizar constantemente o ECGLab”.

Camilla Muniz
Ciencia Hoje On-line