Álcool mais limpo

 

A técnica criada por cientistas brasileiros diminui pela metade a produção de vinhaça, resíduo da fabricação de etanol usado como adubo nos canaviais e cuja concentração elevada em uma área pode causar danos ambientais (foto: Robert Lincolne/ sxc.hu).

O álcool derivado da cana-de-açúcar não é tão verde quanto se pensa: sua produção gera um resíduo poluente, cujo descarte adequado representa um alto custo para as usinas. Mas pesquisadores brasileiros acabam de desenvolver uma técnica que reduz pela metade a produção desse rejeito. O processo pode garantir grande economia para a indústria nacional, além de diminuir consideravelmente o risco de danos ao meio ambiente.

O etanol é produzido a partir do açúcar presente no caldo e no melaço da cana por meio da ação de fungos microscópicos (leveduras) em um processo chamado fermentação, que também gera uma mistura de água com matéria orgânica, denominada vinhaça (ou vinhoto). Rica em potássio, a vinhaça é geralmente usada como adubo, especialmente nos canaviais.

Mas a substância pode contaminar rios e lençóis freáticos pelo excesso de potássio e matéria orgânica que contém. Por isso, a legislação determina que ela seja despejada em pouca quantidade ao longo de grandes áreas. O problema é que, para cada litro de etanol, são produzidos 12 litros de vinhaça, e a estocagem e o transporte de tanto resíduo representam um alto custo para as indústrias.

A solução para a questão foi encontrada por cientistas da Universidade de São Paulo (USP) e da empresa de consultoria Fermentec. A equipe, que há quatro anos busca uma forma de diminuir a produção de vinhaça na fabricação de álcool, duplicou a concentração do caldo de cana a ser fermentado e diminuiu a temperatura do processo – de 33 ºC para 27 ºC. Essas medidas reduziram de 12 para 6 litros o volume de vinhaça produzido por litro de etanol.

Mas, como o caldo de cana concentrado tem mais açúcar, o produto final gerado pelo novo método apresenta teor alcoólico de 16%, o dobro do obtido na produção convencional. Normalmente as leveduras não resistiriam a teores alcoólicos tão elevados e precisariam ser descartadas ao fim do processo.

O engenheiro agrônomo Luíz Carlos Basso, professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), da USP, e um dos autores do projeto, explica que o segredo para o êxito da técnica é a redução da temperatura de fermentação. “O resfriamento do meio em que ocorre a fermentação aumenta a resistência das leveduras, que podem sobreviver a um nível de álcool até duas vezes maior”, esclarece.

Basso ressalta que a refrigeração permite que os microrganismos continuem sendo reutilizados ao final de cada processo de fermentação, como já acontece tradicionalmente na produção do etanol brasileiro. “A reciclagem da levedura torna o procedimento mais rentável e menos demorado”, acrescenta.

Vantagens econômicas e ambientais
A redução do volume de vinhaça proporcionada pela nova técnica facilita o reaproveitamento do resíduo, o que reduz o risco de danos ambientais e diminui o gasto dos produtores. “Será necessária a metade da frota de caminhões-tanque que é usada hoje para transportar o produto”, avalia Basso. “Só com essa economia, o investimento em sistemas de refrigeração, necessários para aplicar a técnica, pode ser recuperado em um ou dois anos.”

Outros benefícios do novo método são a economia de energia térmica usada para aquecer e separar a vinhaça e o etanol, já que a quantidade da mistura é menor. Além disso, espera-se um menor consumo de antibióticos na fermentação, pois a maior concentração alcoólica ajuda a eliminar as bactérias presentes no produto. A nova técnica foi testada pela Fermentec em escala piloto em uma destilaria no município de Serrana (SP) e deverá ser aplicada em escala industrial ainda este ano.

Barbara Marcolini
Ciência Hoje On-line
06/07/2009