A hipertensão arterial – doença crônica não transmissível que aumenta o esforço do coração para bombear sangue para o organismo – atinge cerca de 30% da população brasileira.
Mas entre índios Kaingang que vivem na Terra Indígena Xapecó, no oeste catarinense, esse percentual é maior: a doença atinge 46,3% dos adultos, como aponta dissertação de mestrado da nutricionista Deise Bresan apresentada ao Programa de Pós-graduação em Nutrição da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
A pesquisa avaliou 355 indivíduos de ambos os sexos maiores de 20 anos da aldeia Pinhalzinho, a segunda mais extensa da Terra Indígena Xapecó. Além da pressão arterial, foram verificados também peso e estatura. Para completar o estudo, a pesquisadora levantou dados sociodemográficos.
Os índices de hipertensão foram mais elevados entre os homens. Mais de 50% deles apresentaram pressão arterial superior a 140/90 mmHg (milímetros de mercúrio), isto é, 14 por 9, como em geral são denominadas, respectivamente, a pressão sistólica (máxima) e a diastólica (mínima). Cerca de 57% dos homens apresentaram também excesso de peso.
Para a coleta de dados, foram empregados medidor de pressão automático de pulso, balança de plataforma portátil e antropômetro (equipamento usado para mensurar o corpo humano ou suas partes). Foram feitas duas medições da pressão arterial em todos os indivíduos avaliados.
Para Bresan – orientada na pesquisa pelo doutor em saúde pública Maurício Soares Leite, do Departamento de Nutrição da UFSC –, os dados preocupam, uma vez que a alta prevalência de obesidade ou sobrepeso é um fator de risco para a hipertensão e outras doenças crônicas não transmissíveis. Além disso, a hipertensão é um dos principais fatores de risco para doenças cardiovasculares, responsáveis por grande parte dos óbitos no Brasil.
Embora a hipertensão tenha se manifestado sobretudo entre indivíduos do sexo masculino, o sobrepeso e a obesidade foram mais elevados entre as mulheres: cerca de 75% estavam com o peso acima do normal. Aproximadamente 40% delas apresentaram níveis sugestivos de pressão arterial elevada. O número de casos de hipertensão, obesidade e sobrepeso foi maior entre indivíduos com mais de 50 anos.
Vida precária
Outros povos indígenas brasileiros também revelaram alta prevalência de hipertensão arterial, obesidade e sobrepeso. Segundo a pesquisadora da UFSC, estudos feitos entre os Xavante e os Suruí ao longo de alguns anos demonstraram recrudescimento do problema. Mas, segundo ela, a prevalência de hipertensão ainda é maior entre os Kaingang da aldeia Pinhalzinho.
Dos indivíduos estudados por Bresan que apresentaram níveis sugestivos de hipertensão, apenas 40% fazem uso de medicamento prescrito por médicos para controle da pressão arterial. “Os dados apontam a necessidade de priorizar o segmento indígena nas políticas e programas direcionados ao controle da hipertensão arterial e das doenças crônicas não transmissíveis”, diz a pesquisadora.
Mudanças nos hábitos de vida do grupo indígena podem, ao menos em parte, explicar esse quadro preocupante. Sua proximidade cada vez maior das áreas urbanas tem propiciado dietas que favorecem aumento de peso. O contato com as cidades é também uma porta aberta para o consumo de álcool e tabaco, que também estão associados à hipertensão.
Condições precárias de vida e baixo índice de educação formal também ajudam a explicar o problema. O estudo da pesquisadora da UFSC constatou que a renda per capita média dos Kaingang é de apenas 300 reais mensais, havendo casos de indivíduos que conseguem obter no máximo 25 reais por mês. Mais de 70% dos moradores da aldeia não concluíram o ensino fundamental.
Franciele Petry Schramm
Especial para a CH On-line/ PR