Bússola bovina

Os fazendeiros devem ser muito desligados, pois nenhum deles tinha percebido até hoje que bois e vacas, quando estão pastando ou descansando, tendem a alinhar seu corpo com o eixo norte-sul. E não estamos falando de orientação geográfica, e sim, magnética. Os bovinos, assim como corços e veados, percebem de alguma forma o campo magnético do planeta e usam-no como parâmetro para seu alinhamento em situações de ausência de estresse.

A tendência do gado a se alinhar de acordo com o eixo magnético norte-sul do planeta foi identificada a partir a análise de fotos de 308 rebanhos disponíveis no programa Google Earth (foto: reprodução).

Essa foi a conclusão de um estudo publicado esta semana no periódico norte-americano PNAS. O trabalho, realizado por pesquisadores alemães e tchecos, usou uma ferramenta pouco usual – o programa de visualização de imagens por satélite Google Earth.

“As fotos ‘congelam’ uma cena, permitindo análises amostrais e estatísticas”, explica à CH On-line uma das autoras do artigo, a zoóloga alemã Sabine Begall, da Universidade de Duisburg-Essen, na Alemanha. “Além disso, qualquer um pode ter acesso a elas e testá-las independentemente”, completa.

Com ajuda do programa, os pesquisadores analisaram a posição de 308 rebanhos ao redor do mundo em diferentes horas do dia. Em média, o orientação do corpo dos bovinos analisados apresentava um desvio de apenas 5,4º em relação ao eixo norte-sul. Eles encontraram resultados semelhantes ao analisar, por observação direta, corços (Capreolus capreolus) e veados (Cervus elaphus) pastando – a diferença foi de 9º e 9,7º respectivamente. Quando estes dormem ou descansam, o desvio é de 7,6º para corços e 10,5º para veados.

Em locais com alta declinação magnética, onde o norte geográfico diverge do norte magnético, a orientação dos animais era feita com base no último, indicando que esses mamíferos devem ter alguma maneira de perceber o campo magnético da Terra. “Embora esse tipo de orientação tenha sido descoberta em pássaros há mais de 50 anos e documentada em vários animais desde então, o local e a natureza do sentido magnético permanecem desconhecidos”, revela Begall.

Benefício fisiológico?
Não é incomum que o gado altere o alinhamento do seu corpo em função das características climáticas – os bovinos mudam de posição para se expor mais ao Sol em dias frios, por exemplo. No entanto, os pesquisadores não encontraram qualquer correlação com o clima nas fotos analisadas. “É possível que a orientação magnética do corpo confira algum benefício fisiológico aos animais”, sugere a zoóloga.

Os pesquisadores agora estão verificando se o fenômeno também ocorre em outros grandes mamíferos e sob quais condições ele não acontece. “Queremos também usar eletroencefalogramas para estudar as funções neurofisiológicas durante o alinhamento”, explica Begall. Mas ela chama a atenção para um importante pré-requisito para a continuidade dos estudos. “Precisamos arrumar financiamento para essa pesquisa”, ressalta. 

Fred Furtado

Especial para a CH On-line
25/08/2008