Caça orientada

O campo magnético terrestre é capaz de influenciar uma série de comportamentos associados à orientação espacial dos seres vivos. Agora biólogos alemães e tchecos descobriram como esse fenômeno natural pode interferir nos hábitos de caça das raposas e aumentar sua eficiência na captura das presas.

A equipe observou que as raposas à espreita tendem a direcionar a cabeça, em seus saltos de caça, o mais próximo possível do polo norte magnético, independentemente da direção do vento ou da posição do Sol. E ainda: nos casos em que a presa está escondida sob a neve ou grama alta, o alinhamento dos ataques ao longo do eixo norte-sul resultou em taxas de captura significativamente maiores.

Salta da raposa
Sequência de um salto de raposa para capturar uma presa na neve. (imagem: BBC)

“Os ataques bem-sucedidos foram agrupados ao longo do eixo norte-sul, com o maior agrupamento no sentido norte e o menor no sul, enquanto os ataques em outras direções foram amplamente mal-sucedidos”, afirma um dos autores da pesquisa, Hynek Burda, da Universidade de Duisburg-Essen, na Alemanha. O estudo foi publicado esta semana no periódico Biology Letters.

O mesmo grupo já havia publicado em 2008 um trabalho sobre a influência do campo geomagnético no comportamento do gado. (Leia matéria da CH On-line sobre a pesquisa)

Saltos direcionados

Burda conta que foi o pesquisador Jaroslav Cerveny, coautor do artigo e professor da Universidade Tcheca de Ciências da Vida, quem observou pela primeira vez que as raposas executam seus saltos de caça com mais frequência no eixo norte-sul do que em outras direções. Ele então convidou seus colegas caçadores, biólogos e estudantes para coletar dados e estudar o fenômeno.

Ao todo, 23 observadores participaram das análises de campo e avaliaram cuidadosamente 592 saltos de 84 raposas. As observações foram feitas em diversos hábitats de 65 localidades da República Tcheca, em diferentes horas do dia e estações do ano, ao longo de mais de um ano.

Segundo Burda, o desafio da equipe era descobrir a razão para esse comportamento das raposas. “Por isso, o passo seguinte foi avaliar estatisticamente os dados para localizar ou excluir a eventual existência de outros fatores que pudessem determinar a preferência direcional das raposas no salto da caça”, diz o pesquisador em entrevista à CH On-line.

Além de comprovarem o sucesso nos ataques orientados para o norte, os biólogos levantaram a hipótese de que o campo magnético pode ser usado pelas raposas não só para determinar a direção. Ele poderia funcionar também como um detector de distância, que permite ao predador identificar a localização exata da fonte sonora, no caso, a presa.

Veja o salto da raposa no momento do ataque à presa


 

“Isso é bastante válido para as raposas, que mostram uma enorme capacidade de atenção e localização auditiva”, destaca Burda. E acrescenta: “Esse achado sobre as raposas pode nos ajudar ainda a compreender melhor o sentido magnético nos mamíferos em geral.”

Mistérios magnéticos

A biofísica Darci Motta Esquivel, que integra um grupo de pesquisa sobre o tema no Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas, explica que, enquanto a influência do campo geomagnético sobre o comportamento animal vem sendo desvendada, o mecanismo dessa interferência dentro dos seres vivos ainda é pouco conhecido.

Enquanto para bactérias, por exemplo, já temos uma explicação razoável do ponto de vista físico, para animais maiores ainda é bem difícil localizar em seu corpo as estruturas magnéticas que detectam esse campo”, avalia.

O homem também sofre influência do campo geomagnético, já que tem dentro de si magnetita

Todos os seres vivos têm em seu organismo material magnético e, graças a ele – de alguma forma ainda não compreendida –, são capazes de detectar o campo geomagnético por meio de suas células nervosas, transmitir esse sinal ao cérebro e gerar um comportamento. No caso das raposas, essa resposta se traduz nos ataques voltados para uma direção magnética específica.

“O homem também sofre essa influência, já que, como outros animais, tem dentro de si magnetita, o mineral mais magnético da Terra”, diz Esquivel. “Mas nós diminuímos essa sensibilidade a partir do momento em que racionalizamos nossa forma de localização, criando o GPS e colocando nomes nas ruas”, pondera.

Assista a um vídeo sobre a influência do campo geomagnético na orientação de abelhas

 

Carolina Drago
Ciência Hoje On-line