Carbono na malha fina

As usinas que utilizam a queima de combustíveis fósseis como fonte energética são tidas como grandes vilãs do aquecimento global. Mas, ao mesmo tempo, elas ainda respondem pela maior parte da energia produzida. Como ainda não é possível substituí-las completamente, vale o esforço para diminuir seu impacto nocivo no meio ambiente.

Um novo material capaz de reter carbono acaba de ser desenvolvido com esse propósito e, embora ainda não tenha sido testado em usinas, já provou seu potencial em experimentos laboratoriais. Os resultados foram publicados na Nature Communications desta semana.

Criado por químicos da Universidade de Lehigh (Estados Unidos), o material é formado por inúmeros poros – o que lhe confere grande área superficial –, é estável em altas temperaturas, prefere o gás carbônico a outros gases resultantes da combustão e, sobretudo, é capaz de reter grandes quantidades de carbono.

Além disso, pode ser produzido a baixo custo e sem interferir muito na eficiência da usina – já que consome relativamente pouca energia.

“O gás capturado pelo nosso material é bom o suficiente para neutralizar significativamente a emissão de carbono pelas usinas”

“Poucos absorventes retêm mais CO2 do que o Peconf [sigla, em inglês, para Estrutura Porosa Organo-nitrídica Covalente e Rica em Elétrons, nome dado ao material] nas condições estudadas”, afirma o químico Kai Landskron, um dos autores do artigo. “O gás capturado pelo nosso material é bom o suficiente para neutralizar significativamente a emissão de carbono pelas usinas”, completa.

A captura do carbono emitido por queima de combustíveis fósseis pode ocorrer antes ou depois da combustão, dependendo da tecnologia empregada.

Para a segunda alternativa, que envolve medidas destinadas a usinas já instaladas, tem se investido em três tipos de sistemas: absorção por membranas (separação física do CO2 de outros gases), absorção química (segregação por meio da interação e difusão do gás com substâncias básicas, como amônia e aminas) e retenção em sólidos (adesão do gás carbônico a superfícies de contato).

O Peconf combina elementos do sistema de absorção química, com grupamentos de amina em sua estrutura, e retenção em sólidos, com uma superfície porosa de alta capacidade aderente. Suas características foram analisadas em laboratório por meio de testes químicos que mediram sua capacidade de reter gás carbônico e nitrogênio.

“O próximo passo é entender como pode ser utilizado em maior escala e implementado em uma usina piloto”, afirma Landskron. 

Termelétrica a carvão na Polônia
Termelétrica a carvão na Polônia. As usinas que utilizam a queima de combustíveis fósseis como fonte de energia são tidas como vilãs do aquecimento global. Pesquisadores estudam formas de reduzir seu impacto nocivo no meio ambiente. (foto: Adam Jakubiak/ Sxc.hu)

Barreiras para aplicação

Apesar dos avanços na pesquisa e do potencial do novo material, o engenheiro químico Alexandre Szklo, do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ), afirma que as técnicas de captura de carbono só foram aplicadas em usinas piloto de pequena escala.

“A maior usina que utiliza um sistema de absorção por solvente químico emite 800 toneladas de CO2 por dia, enquanto uma termelétrica de 500MW emite 8 mil toneladas por dia”, diz Szklo.

Ele aponta como principal barreira a infraestrutura necessária para montar um sistema de captura de carbono, que chega a ocupar metade da área da usina. Além disso, costuma diminuir a sua eficiência energética e envolver enormes gastos com água, já que os sistemas precisam de vapor de água para funcionar bem.

“70% da matriz energética mundial ainda se baseia em combustíveis fósseis”

Mas, num cenário de crescente investimento mundial em fontes alternativas de energia, qual seria a necessidade de se investir em captura de carbono para usinas termelétricas se elas estão a caminho da extinção?

Ledo engano. “Nós pensamos que o carvão é uma energia do passado; quando pensamos em carvão, pensamos no filme Mary Poppins (1964)”, diz Szklo. “Mas 70% da matriz energética mundial ainda se baseia em combustíveis fósseis, sendo 40% carvão, 20% gás natural e 10% óleo”, completa, reforçando que ainda há, portanto, necessidade e espaço para o desenvolvimento de tecnologias de captura de carbono.

Gabriela Reznik
Ciência Hoje On-line