Li seu artigo sobre astrologia versus astronomia e pude perceber que, apesar de ter lido um pouco sobre as origens, o senhor não foi além de uma cultura de almanaque, o que não cai bem em quem se julga um estudioso ou, como o senhor mesmo prefere, um cientista.
Astrologia não é ciência. Nisso concordamos. Astrologia é um campo de saber que está fora do âmbito da ciência. Entretanto, a astrologia é um campo do saber, assim como a ciência também o é. São duas formas de ver o mundo, duas formas de se relacionar com o real. Ou seja, entre os diversos saberes, a ciência é somente um saber específico, assim como a astrologia.
Heidegger já dizia que a ciência não pensa, ela apenas opera. Não há pensamento na ciência porque ela opera por partição do real. Ao repartir, ela perde a capacidade de falar do todo. A ciência amesquinha a questão da verdade para o verificável e o imputável. E hoje o maior inimigo da ciência já sabemos não ser mais a religião, mas sim a magia, isto é, a natureza como um outro eu. Mas esta já é outra questão.
Fato é que a astrologia não pode ser avaliada pelos critérios “científicos”, pois não é ciência mesmo e pertence a um outro jogo de linguagem. A questão é que hoje o mundo científico no seu exercício do controle do discurso diz que só é verdade o que é “cientificamente provado”. No entanto, a única verdade da qual a ciência pode falar é da verdade científica e de nenhuma outra. A ciência só pode dizer da verdade da própria ciência. Ponto final.
E o que é a ciência? É a apreensão das regularidades do mundo. O cientista observa fenômenos e deles guarda o que é regular e descarta o que é particular. Aristóteles já dizia que do particular não se faz ciência. Ora, a astrologia tem como foco de interesse o singular, o particular. Daí, já temos uma dissonância.
Então temos que astrologia e ciência pertencem a dois campos distintos de saber. E quem bem definiu essas diferenças foi Wittgenstein, um filósofo austríaco. Ele fala de jogos de linguagem. Ciência e astrologia são dois jogos de linguagem distintos. Se alguém olhar a astrologia desde o ponto de vista “científico” e comentá-la e julgá-la, estará agindo como um comentarista de futebol narrando uma partida de vôlei. É falta toda hora porque os jogadores põem a mão na bola. E ele não será capaz de entender porque a bola na rede não é gol!!
O senhor mencionou que os astrólogos acreditam [sic] que os planetas influenciam os acontecimentos na Terra. A astrologia não diz isso! A astrologia expressa no verso do “assim na terra como no céu” descreve uma sincronicidade entre os movimentos do céu e os acontecimentos na Terra. Ou seja, através dos movimentos no céu, podemos ler simbolicamente a qualidade do momento e, portanto, o sentido dos acontecimentos na Terra.
Por exemplo, podemos dizer da tristeza de alguém ao olharmos para uma pessoa que esteja triste. Creio que o senhor, se tiver o mínimo de sensibilidade, já deve ter lido este “signo” [sinal] antes, em algum momento de sua vida. No entanto, ninguém diz que é o olhar daquela pessoa o que a deixa triste. O olhar triste de alguém reflete e, ao mesmo tempo, nos revela sua tristeza, mas não lhe causa qualquer infelicidade.
Da mesma forma com os planetas. Tanto que os gregos chamavam os planetas de gramata, ou seja, letras que escreviam a qualidade do momento em que o universo estaria vibrando. Os astrólogos antigos já diziam que “os astros inclinam mas não determinam”. Logo sua tese parece não ter validade científica porque parte de um pressuposto falso.
Acho que essa discussão nunca terá fim, o que é bom, pois é do diálogo que o homem avança. O que é triste é verificar que quase todos os astrólogos se interessam pelas contribuições inestimáveis da astronomia, esse campo de saber profano, enquanto os astrônomos sequer leem sobre o que realmente trata a astrologia, o campo do saber sagrado.
Atenciosamente,
Jayme Carvalho
* Releia o artigo “Astronomia versus astrologia”, publicado na CH 256, e a réplica do autor às críticas.