Cientistas desvendam papoula sem morfina

Pesquisadores australianos descobriram uma variedade de papoula que não produz codeína e morfina. A espécie normalmente produz esses compostos, dos quais derivam drogas como o ópio e a heroína que, embora sejam poderosos analgésicos, podem criar dependência no consumidor. A mutante natural identificada pelos cientistas pode levar, no futuro, ao desenvolvimento de medicamentos que não viciem o paciente.

Flor de papoula ( Papaver somniferum ). Foto: Henriette Kress / www.ibiblio.org/herbmed

Na Top1, como ficou conhecida a nova variedade da Papaver somniferum , não acontece a síntese bioquímica da codeína e da morfina, o que conduz à acumulação das substâncias precursoras dessas drogas: a tebaína e a oripavina. Esses compostos, usados em larga escala por indústrias farmacêuticas que produzem fortes analgésicos, são encontrados em maior concentração nas plantas Top1 do que nas P. somniferum convencionais. A única mudança visível no fenótipo da planta mutante é o látex, com pigmento mais branco do que o normal.

A planta mutante foi encontrada na Tasmânia em 1995, mas só agora foi possível entender como funciona a variação genética. Os pesquisadores identificaram dez genes com função significativamente reduzida na Top1, fator que pode ser responsável pelo bloqueio da síntese da morfina.

“Entender esses genes é um passo importante para desenvolver papoulas que servirão de base para uma nova geração de remédios alternativos que não viciam”, afirma à CH On-line Philip Larkin, pesquisador da Organização Nacional de Pesquisa da Austrália. Larkin é o principal autor do estudo, publicado em 23 de setembro na revista Nature .

A planta mutante pode no futuro facilitar a produção de analgésicos mais seguros e mais bem tolerados pelo corpo humano do que a morfina, como a buprenorfina ou a oxicodona, cuja síntese em laboratório é muito complicada. Larkin explica que a buprenorfina e outros derivados da tebaína e da oripavina já estão no mercado e são utilizados no tratamento de viciados em narcóticos como o ópio. “A buprenorfina é naturalmente segura, pois, em grandes quantidades no cérebro, inibe sua própria atividade, o que diminui os riscos de overdose”, explica.

Segundo o pesquisador, sua equipe está trabalhando agora no isolamento de genes específicos envolvidos na síntese de morfina em plantas transgênicas, para obter novos produtos para a indústria farmacêutica.

Renata Moehlecke
Ciência Hoje On-line
29/09/04