Colorido neuronal

A imagem acima, que integra a exposição Paisagens neuronais, mostra células nervosas da retina de um macaco. Cada imagem da mostra recebeu comentários de intelectuais de diversos horizontes. “Nostalgia do encéfalo” foi o comentário do escritor espanhol Enrique Vila-Matas para o exemplo acima (foto: Nicolás Cuenca y Gema Martínez-Navarrete / Depto. de Biotecnología, Universidad de Alicante).

Cientificamente revolucionárias e esteticamente belas. Esta pode ser a definição para as imagens reunidas na exposição Paisagens neuronais, em cartaz na Casa da Ciência, no Rio de Janeiro. A mostra reúne o que há de mais fascinante e instigante na neurociência, ao mesmo tempo em que revela a beleza por trás das últimas descobertas sobre o cérebro e o sistema nervoso.

Foram reunidas 50 imagens produzidas com técnicas variadas e cedidas por laboratórios de todo o mundo – inclusive no Brasil. Elas foram selecionadas unicamente em função de seu apelo estético e poderiam facilmente ser usadas para decorar casas e escritórios ou figurar nas paredes de museus e galerias de arte.

Teto óptico de peixe paulistinha. A imagem recebeu, do escritor espanhol Eduardo Lago, o comentário “Brainstorming” (foto: Michael Hendricks / Developmental Neurobiology, Temasek Life Sciences Laboratory, National University of Singapore). Clique na imagem para ampliá-la. 

“Apesar da incrível beleza estética, é importante termos em mente que não se trata de arte”, lembra a neurocientista Suzana Herculano-Houzel, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), consultora da Casa da Ciência na montagem da exposição. As imagens, lembra ela, foram obtidas antes de tudo com finalidade científica, e isso as distingue na sua essência das obras artísticas.

Herculano-Houzel explicou em uma palestra na abertura da mostra, na semana passada, a evolução das técnicas de coloração celular usadas para a obtenção das imagens do cérebro. “Como as células nervosas não têm cor, várias técnicas foram criadas nos últimos anos para pigmentá-las, de forma a permitir seu estudo”, explica a neurocientista.

A mostra apresenta imagens obtidas com diferentes gerações de técnicas de visualização dos neurônios, do método pioneiro usado pelo italiano Camillo Golgi (1843-1926), que usava nitratos de prata para colorir os neurônios, ao uso das proteínas fluorescentes em animais geneticamente modificados para desenvolver neurônios coloridos, coroado com o Nobel de Química de 2008.

O aperfeiçoamento de cada técnica permitiu aos neurocientistas desvendar novos aspectos do funcionamento do cérebro. O ápice desse processo foi a obtenção em laboratório dos ratos brainbow – trocadilho que reúne os termos em inglês para ‘cérebro’ e ‘arco-íris’ – com o uso de proteínas fluorescentes transgênicas de diferentes cores. “Com essa técnica é possível identificar cada neurônio de maneira individual e ainda descobrir para onde ele leva a informação”, explica Herculano-Houzel. “Isso é um presente magnífico para os neurocientistas.”

Impulsos que inspiram

A imagem mostra segmentos de diferentes neurônios do camundongo brainbow. Ela foi obtida com a técnica revolucionária que recorre a proteínas fluorescentes de diferentes cores para a visualização de neurônios individuais (foto: Jean Livet, Joshua R. Sanes e Jeff W. Lichtman / Universidade Harvard, MCB). Clique na imagem para ampliá-la.

Para aproximar ainda mais a ciência da arte e do público, foram incluídas na mostra frases de artistas, poetas e filósofos que interpretaram cada uma das imagens. “Nostalgia do encéfalo”, por exemplo, foi o título dado à imagem de neurônios da retina de um macaco. Outros comentários brincam com o diálogo das imagens científicas com a obra de artistas como o espanhol Joan Miró ou o holandês Vincent van Gogh.

A exposição traz ainda reproduções históricas de desenhos de Santiago Ramón y Cajal (1852-1934) e outros pesquisadores. A mostra é uma homenagem a esse médico e histologista espanhol, que foi pioneiro nos estudos modernos da estrutura microscópica do cérebro e descreveu com precisão o corpo celular dos neurônios.

Apresentada originalmente em Barcelona, na Espanha, em 2006, Paisagens neuronais foi montada em comemoração ao centenário do Nobel de Fisiologia ou Medicina recebido em conjunto por Ramón y Cajal e Camillo Golgi em 1906. A exposição foi promovida por um banco na Espanha e trazida ao Brasil pelo Instituto Cervantes. Além das imagens, a mostra traz também visitas guiadas, debates, vídeos e palestras sobre os avanços da neurociência.

Exposição Paisagens Neuronais
Onde: Casa da Ciência da UFRJ – Rua Lauro Muller, 3 – Botafogo – Rio de Janeiro (RJ)
Quando: 6 de janeiro a 15 de fevereiro de 2009. De terça a sexta,
das 9h às 20h: sábados, domingos e feriados, das 10h às 20h.
Quanto: Entrada franca.
Visita de grupos: (21) 2542-7494 ou [email protected]

Juliana Marques
Ciência Hoje On-line
13/01/2009