Columbia: nem tudo foi perdido

O último vôo do ônibus espacial Columbia retomou um hábito do qual a Nasa havia se afastado por quase três anos: missões exclusivamente científicas. Mais de 80 experimentos com microgravidade foram realizados durante os 16 dias do vôo. Os sete tripulantes se revezavam em turnos de 12 horas e monitoravam os estudos durante todo o tempo disponível. Uma conexão por satélite permitiu que dados obtidos fossem enviados à Terra em tempo real, o que impediu que tudo se perdesse com o trágico fim da nave, em 1 o de fevereiro. Os experimentos a bordo da Columbia estavam divididos em seis áreas: biologia, biomédica, ciências da terra e do espaço, física, desenvolvimento de produtos espaciais e desenvolvimento de tecnologia.

 

Avaliar a forma de uma chama e suas estruturas internas na microgravidadefoi o objetivo de um dos experimentos a bordo da Columbia (fotos: Nasa)

Um dos estudos investigou o comportamento do fogo na microgravidade. Ao se acender uma vela na atmosfera terrestre, o fogo toma a forma familiar de uma lágrima, causada pelo ar quente e sem oxigênio ascendente e pelo ar fresco que alimenta a chama. Na microgravidade, o processo de combustão é retardado, o que facilita seu estudo.

 

As chamas tomam forma inusitada no espaço — bolas pequenas, quase invisíveis, que flutuam — e se espalham mais rapidamente contra o vento que a seu favor, ao contrário do que ocorre na Terra. Embora o fogo seja geralmente mais fraco no espaço, ele pode ser mantido sob condições mais extremas. Seu estudo em microgravidade tem três objetivos: investigar formas mais eficientes de combustão, que produzam menos fuligem (que causa poluição atmosférica); aumentar a eficiência dos motores e reduzir a emissão de gases tóxicos; e a produção de extintores de incêndio mais eficazes.

Outro experimento a bordo da Columbia focalizou o crescimento de tumores de próstata, doença que mata mais de 30 mil homens por ano. Para descobrir novas terapias para o tratamento de doenças, os cientistas precisam de culturas de tecidos que se comportem como no corpo humano. Porém, a maioria das culturas produz células delgadas e achatadas, diferentes das encontradas nos órgãos humanos. Curiosamente, as células cultivadas na microgravidade do espaço se parecem mais com as encontradas nos tecidos humanos aqui na Terra.

 

Padrão de crescimento em espiral apresentado por musgo
levado ao espaço em experimento anterior da Nasa

 

A tripulação da nave também estudou a influência da gravidade na estrutura das células de musgo. O musgo é composto de longas cadeias de células que crescem a partir de filamentos e se distribuem ao acaso. Expostas à microgravidade, essas células não crescem aleatoriamente: formam uma estrutura em espiral. Esse experimento pode ajudar os cientistas a compreender o papel da gravidade na evolução das células e da vida na Terra.

Infelizmente, foram perdidos os espécimes de plantas e animais levados pela Columbia, além das culturas de tecido que estavam a bordo da nave. Os experimentos médicos e biológicos foram os mais prejudicados pelo acidente, pois dependiam do retorno das amostras à Terra, para que fossem analisadas ou comparadas a amostras de controle. Já os experimentos que puderam ser concluídos na nave, como os de física e tecnologia, e tiveram os resultados enviados à Terra com sucesso serão o legado dessa trágica missão.

Adriana Melo
Ciência Hoje on-line
10/02/03

 

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