Os resultados das pesquisas de intenção de voto estão entre os assuntos mais comentados nesse período eleitoral. Praticamente toda semana e, ultimamente, quase todos os dias, surge uma nova pesquisa sobre a preferência da população em relação aos candidatos à presidência da República e ao governo dos estados que terão segundo turno.
Os resultados dessas pesquisas não somente influenciam diretamente a forma como os candidatos conduzem as campanhas, mas também acabam influenciando o próprio eleitorado.
Houve grande frustração pelo fato de nenhum dos institutos de pesquisa de opinião ter conseguido prever com certeza o segundo turno para as eleições presidenciais. O resultado das urnas surpreendeu a muitos, pois houve uma brusca mudança entre a vontade do eleitorado retratada nas sondagens e a realidade apresentada pelas urnas.
Os resultados dessas pesquisas sempre são divulgados ao lado da sua margem de erro, ou seja, o grau de precisão do resultado. No caso das pesquisas para presidente, a margem de erro costumava ser de dois pontos percentuais, para mais ou para menos, criando expectativas, como a situação de “empate técnico” entre dois candidatos.
É comum que a maioria das pessoas se pergunte: como pode ser possível fazer previsões como estas entrevistando apenas 2 ou 3 mil pessoas, em um universo de mais de 120 milhões de eleitores? É possível prever o futuro – no caso, quem será o próximo presidente? Essas previsões são científicas?
As pesquisas de opinião são baseadas em métodos estatísticos que levam em conta a distribuição da população brasileira por idade, sexo, nível de escolaridade, renda mensal e região do país em que vive. Contudo, cada instituto adota metodologias diferentes e, por isso, surgem resultados diferentes, mesmo para pesquisas realizadas na mesma época.
Modelos da natureza
A ciência costuma trabalhar com previsões feitas por meio de modelos desenvolvidos e testados a partir da observação da natureza. As leis da mecânica estabelecidas no século 17 por Isaac Newton (1642-1727), por exemplo, permitem prever o movimento de queda de um corpo ou quais são as órbitas dos planetas ao redor do Sol.
Seu poder de previsão é tão grande que foi possível descobrir, a partir de irregularidades na órbita de planeta Urano, a existência no Sistema Solar de um planeta que ainda não havia sido observado. Cálculos feitos de forma independente pelo matemático Urbain Leverrier (1811-1877), na França, e pelo astrônomo John Couch Adams (1819-1892), na Inglaterra, previram a localização do planeta desconhecido.
Ele foi observado em 23 de setembro de 1846 pelo astrônomo alemão Johann Gottfried Galle (1812-1910) e pelo dinamarquês Heinrich Louis d’Arrest (1822-1875) e posteriormente batizado de Netuno. Sua descoberta representou a maior glória do modelo newtoniano, pois pela primeira vez foi possível prever a posição de um planeta a partir de cálculos matemáticos.
Curiosamente, muitos dos planetas descobertos em outros sistemas estelares (que já são 500 na data da publicação dessa coluna) utilizam cálculos semelhantes.
Todo modelo tem o seu limite de validade, ou seja, situações nas quais ele não consegue descrever com precisão os fenômenos observados.
As leis da mecânica newtoniana não conseguem descrever a luz e os fenômenos eletromagnéticos, a estrutura atômica da matéria ou eventos que ocorrem com velocidades próximas à da luz ou na presença de campos gravitacionais intensos. Nesse caso, outras teorias e modelos são necessários para explicar esses fenômenos naturais.
Equações de Maxwell e mecânica quântica
A maioria dos fenômenos eletromagnéticos são descritos pelas equações de Maxwell, que foram organizadas em 1865 pelo físico escocês James Clerk Maxwell (1831-1879). Antes dele, diversos pesquisadores tinham estudado fenômenos associados a campos elétricos e magnéticos, como o caso de Ampère, Oersted, Faraday e outros, mas coube a Maxwell propor um modelo unificado para explicar essas interações.
As equações de Maxwell descrevem como os campos elétricos e magnéticos interagem entre si e também mostram que a luz é um fenômeno eletromagnético e se propaga na forma de uma onda. Essa descrição, contudo, não funciona para explicar os fenômenos na escala atômica. Nesse caso, um novo modelo teve que ser desenvolvido.
A mecânica quântica é um modelo físico que começou a ser desenvolvido no começo do século 20. Aos poucos, os físicos descobriam novos fenômenos que os modelos da época – a mecânica newtoniana e o eletromagnetismo de Maxwell – não conseguiam explicar de maneira satisfatória.
Um exemplo disso foi a descoberta de que a luz pode, em algumas situações, não se comportar como uma onda eletromagnética, como previsto pelas equações de Maxwell, mas sim como pacotes de energia proporcionais à frequência da radiação incidente. Posteriormente, esses pacotes de energia foram chamados de fótons. Essa proposta foi feita por Albert Einstein (1879-1955) em 1905 e é considerada um dos marcos desse novo modelo.
A mecânica quântica não foi apenas um novo modelo para descrever os fenômenos na escala atômica, mas também revolucionou a forma de entendermos a natureza. Entre as inúmeras mudanças que ela introduziu, talvez a mais impactante tenha sido a descoberta de que, quando medimos com absoluta precisão a posição de uma partícula, o seu momento (que é o produto da sua massa por sua velocidade) não pode ser conhecido com precisão.
Essa limitação não é técnica, no sentido de uma limitação dos equipamentos que fazem a medição, mas sim uma imposição da natureza. Esse é o princípio da indeterminação, proposto em 1927 pelo alemão Werner Heisenberg (1901-1976).
Dessa forma, mesmo os modelos e as teorias desenvolvidos pela física e pela ciência de forma geral estão em transformação constante: quando se descobre uma nova situação, o modelo deve ser aprimorado para descrever melhor o fenômeno observado.
No caso de modelos estatísticos que descrevem as opiniões das pessoas, que estão a todo momento sendo influenciadas por muitas variáveis, principalmente a propaganda eleitoral, é sempre difícil conseguir uma precisão absoluta que se refletiria em pesquisas de opinião sem erros.
De fato, o resultado absoluto só é obtido quando se faz a pesquisa levando em conta todas as opiniões, ou seja, a eleição computando cada voto dado. Nesse caso, porém, já não há a necessidade de qualquer modelo ou previsão!
Adilson de Oliveira
Departamento de Física
Universidade Federal de São Carlos