Corais brancos

Nas águas do litoral carioca, insuspeito fenômeno tem chamado a atenção de biólogos. É o branqueamento de corais. Nas proximidades de Paraty e Angra dos Reis, corais que deveriam apresentar sua coloração natural – em tons marrons ou dourados – estão agora brancos como papel.

O que estaria por trás da inesperada alteração? “O branqueamento acontece quando o coral é exposto a temperaturas mais elevadas do que aquela com a qual está habituado”, explica o biólogo marinho Gustavo Duarte, do Projeto Coral Vivo.

Em todo o mundo, a maioria dos corais vive em águas cuja temperatura fica entre 26 ºC e 29 ºC. Mas quando a temperatura oceânica ultrapassa 31 ºC, acontece o branqueamento. E, no início de 2014, os mares da região registraram temperaturas de 34 ºC – recorde desde que começaram as medições. É provável que a mudança esteja relacionada com a variabilidade climática do planeta.

Coral esbranquiçado
Coral esbranquiçado na baía de Ilha Grande, no estado do Rio de Janeiro, fotografado no início de 2014. (foto: ESECTamoios)

Diante do fenômeno, os pesquisadores acreditam que cerca de 15% dos corais afetados na região já tenham morrido.

Sobre cores e simbiose

Branqueamento de corais não é um fenômeno novo. Os primeiros casos foram reportados nas décadas de 1970 e 1980. Desde então, observações têm sido cada vez mais frequentes.

Em função do aumento da temperatura da água, as algas sofrem alterações metabólicas e passam a produzir substâncias tóxicas para o coral

Na verdade, a cor de um coral é definida pela relação simbiótica que ele estabelece com pequeníssimas algas do gênero Symbiodinium. É uma interessante troca. O coral, com sua estrutura física, oferece a elas posição privilegiada em relação à luz. E as algas, em troca, realizam a fotossíntese e doam o excedente de sua energia e de seus nutrientes para o coral.

Portanto, são elas – as algas – que dão ao organismo a típica coloração marrom ou dourada. A cor do esqueleto dos corais é branca. Trata-se de uma estrutura composta essencialmente de carbonato de cálcio. Do ponto de vista fisiológico, o branqueamento acontece devido à interrupção da simbiose entre o coral e as pequenas algas.

Em função do aumento da temperatura da água, as algas sofrem alterações metabólicas e passam a produzir substâncias tóxicas para o coral, que, como estratégia de defesa, as expele. Dessa forma, o esqueleto do coral fica à mostra, já que seu tecido é transparente para permitir a penetração da luz. Esse processo pode provocar a morte do coral.

Esqueleto de coral
O esqueleto do coral é uma estrutura calcária, de cor branca, que fica evidente depois que as algas do gênero ‘Symbiodinium’ são expelidas do organismo, por passarem a produzir substâncias tóxicas em decorrência do aumento da temperatura da água. (foto: ESECTamoios)

Quando o branqueamento acontece nos ecossistemas dos oceanos Pacífico, Índico ou do Caribe, a taxa de mortalidade de corais pode chegar a 80%. No litoral brasileiro, porém, esse número costuma ficar em torno dos 10%.

“Tudo indica que nossos corais são mais resilientes ao fenômeno do branqueamento”, diz Duarte. Segundo os pesquisadores, é provável que isso se deva à elevada quantidade de alimentos e nutrientes disponíveis em nossas águas. Tamanha abundância explica, em parte, por que os recifes de coral da costa brasileira ficam imersos em águas que estão entre as mais turvas do mundo para áreas recifais.

Para que serve um coral?

“São os corais os seres responsáveis pela complexidade estrutural do ambiente marinho”, afirma Duarte. O leito oceânico pode ser entendido, basicamente, como um ambiente de duas dimensões; mas, graças aos corais, ele acaba adquirindo características tridimensionais.

Em outras palavras, os corais dão aos fundos dos mares certo ‘relevo’, certa ‘topografia’ – na qual toda a complexidade e exuberância da vida marinha poderá se desenvolver. Corais são, portanto, os grandes refúgios da biodiversidade subaquática.

Henrique Kugler
Ciência Hoje On-line