De coadjuvante a protagonista

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Separação da fase glicerínica durante o processo de produção de biodiesel em escala laboratorial.

No processo de produção de biodiesel, a obtenção de um litro do combustível tem como contrapartida a formação de aproximadamente 100 ml de glicerina bruta. Esse coproduto até então subestimado no mercado brasileiro pode ter aplicações importantes, como mostram trabalhos realizados no Centro de Pesquisa em Química Aplicada (Cepesq) do Departamento de Química da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Em 2008, quando for obrigatória a mistura de 2% do combustível ecológico ao óleo diesel convencional, estima-se que o volume de glicerina produzido em escala nacional será da ordem de 100 milhões de litros.

 
Estudos feitos no Cepesq indicam que essa glicerina poderá ser empregada na fabricação de um compósito (material constituído pela mistura de duas ou mais substâncias) de grande interesse para as indústrias de embalagens e de construção civil, que buscam meios mais baratos e de boa qualidade para o acondicionamento de produtos ou para a edificação de moradias populares.

A mistura de glicerina bruta com amido e fibras vegetais leva à formação de painéis muito semelhantes a compensados. As placas podem ser utilizadas também na fabricação de peças de artesanato, gerando trabalho e renda para populações carentes. “O processo é duplamente ecológico, pois dá fim nobre a um subproduto poluente e também a fibras vegetais, que podem, dependendo da forma de descarte, comprometer a qualidade do meio ambiente”, lembra o químico Luiz Pereira Ramos, coordenador dos trabalhos da equipe.

 
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Etapa de produção de biodiesel a partir de óleos vegetais em escala laboratorial
(fotos: Luiz P. Ramos – Cepesq/UFPR)

A plena aplicação dos painéis ainda depende de testes de campo para verificar a resistência do material à água e definir as espécies de plantas que fornecem as fibras mais resistentes. “Mas os experimentos realizados até agora em laboratório confirmam a viabilidade de uso real do produto”, garante Ramos. Essa última e crucial etapa, diz o químico, requer parcerias com a iniciativa privada que certamente irão redirecionar o futuro das pesquisas.

 
Vale destacar a diferença entre glicerina bruta e purificada. A forma obtida no processo de produção de biodiesel vem misturada a água, ácidos graxos e sabões. Só depois de purificada é que a substância pode ser utilizada na área de química fina e no setor alimentício. Mas a tecnologia exigida para extração das impurezas tem custo elevado e é dominada por apenas algumas empresas brasileiras.
 

“O elevado custo de purificação restringe o uso da glicerina bruta”, diz Ramos. Por isso é essencial, segundo o pesquisador, buscar meios de aproveitar o material na forma como ele é gerado no processo de produção do biodiesel. Além de seu emprego na elaboração de compósitos, a glicerina ‘contaminada’ pode entrar também na produção de energia pela combustão e na produção de biogás e fertilizantes. Outra vertente da pesquisa em curso no Cepesq é o uso da glicerina como plastificante de filmes biodegradáveis. Mas essa alternativa requer inevitavelmente a sua purificação. 

 Gabriela Diniz
Especial para a CH On-line / PR
19/10/05