Descobrindo os costões brasileiros


Algas do gênero Caullerpa identificadas na região da costa Ilha Anchieta, em Ubatuba (SP), identificadas com o novo método de mapeamento de costões. Essas algas crescem na zona de maré e são constituídas por uma única célula gigante dotada de múltiplos núcleos  (fotos: Natalia Pirani Ghilardi).

Embora as naus portuguesas tenham atracado nas praias brasileiras há mais de 500 anos, grande parte da biodiversidade da costa do país ainda espera ser descoberta. Dos mais de 8 mil quilômetros de extensão do nosso litoral, apenas 1,5 km – ou seja, 0,02% – foram mapeados. Mas isso pode mudar. Um pesquisador da Universidade de São Paulo (USP) está aplicando com sucesso um método inédito de mapeamento de costões (formações rochosas costeiras) que está permitindo descrever povoamentos desses ecossistemas, bem como de recifes de coral, de algas calcárias e de arenito com mais rapidez e eficácia. Em apenas dois anos e meio, já foram estudados 4 km da costa do país com essa técnica.

O novo método oferece uma alternativa à lenta técnica de análise que tem como unidade de estudo as espécies. “Nosso foco são os povoamentos e apenas suas espécies dominantes”, explica o autor do estudo, o professor do Instituto de Biologia da USP Flávio Berchez. A nova técnica foi inspirada pela ecologia terrestre, que mapeia as paisagens por fotos aéreas ou de satélite, onde é possível analisar as formações predominantes.

O novo modelo de análise é feito em quatro etapas. Inicialmente as regiões a serem mapeadas são fotografadas por biólogos mergulhadores que integram a equipe de pesquisa. Em seguida, identificam-se os povoamentos de costões, comparando-se essas fotos com as descrições existentes na literatura. A segunda etapa é o mapeamento propriamente dito: os pesquisadores usam um aparelho GPS (sistema de posicionamento global) para anotar as posições desses povoamentos.

Após essa localização, as fotografias são novamente analisadas para que a porcentagem da cobertura dos povoamentos em relação à área total do costão seja quantificada. A quarta etapa consiste em um estudo detalhado do povoamento, incluindo todas as espécies e não só as dominantes. “O novo método analisa superficialmente uma área extensa”, conta Berchez. “Mais tarde, outros pesquisadores podem aprofundar o estudo, tendo nossos resultados como base.”

Algas do gênero Dichtotomaria fotografadas na região da costa Ilha Anchieta. Essas algas são ligeiramente calcificadas e avermelhadas.

O mapeamento dos costões vai ajudar na localização da flora e fauna existentes no relevo submarino, que, além de servir de berçário para diversas espécies de peixes, tem potencial médico-farmacológico que vem sendo estudado por pesquisadores no mundo inteiro. A identificação de algas e corais no litoral brasileiro também pode ser usada como indicador ambiental, já que esses grupos são sensíveis à poluição e sua ausência em determinados locais pode ser um flagrante de contaminação da água.

O projeto Levantamento Fisionômico das Comunidades Bentônicas de Substrato Consolidado do Litoral Brasileiro já mapeou a enseada das Palmas (Parque Estadual de Ilha Anchieta, Ubatuba, SP), o ilhote da Ponta do Baleeiro (São Sebastião, SP) e a ilha do Monte Pascoal (Bertioga, SP). Estão sendo estudadas também as ilhas do Guará e da Moela e a ponta do Munduba (Guarujá, SP) e a ilha do Francês (Itapemirim, ES), numa extensão total de 4 km – quase três vezes o que havia sido mapeado até então. Além do professor Flávio Berchez, doutorandos, alunos de iniciação científica da USP e outros pesquisadores participam do projeto. 

Rosa Maria Mattos
Ciência Hoje On-line
26/06/2006