Desenrolando o plantio

Uma fita biodegradável com sementes integradas promete aumentar a velocidade de plantio e dobrar a produtividade de vários cultivos, beneficiando a agricultura familiar. Criada pelo engenheiro agrônomo Mateus Marrafon, a fita-semente permite que o plantio seja feito com o simples desenrolar do material no campo com auxílio de uma máquina rudimentar.

Na fita, as sementes já vêm tratadas (livres de patógenos e imunes a algumas doenças) e enriquecidas com micronutrientes essenciais para o seu desenvolvimento

A fita, patenteada como ‘semeadura de precisão’, foi desenvolvida para auxiliar produtores que não dispõem de instrumentos de produção modernos (em geral, caros) nem contam com o auxílio de profissionais como agrônomos. Nela, as sementes já vêm tratadas (livres de patógenos e imunes a algumas doenças) e enriquecidas com micronutrientes essenciais para o seu desenvolvimento.

Fabricada com fibras de celulose, a fita-semente é produzida de acordo com a cultura e com o tipo de solo a ser cultivado. “Os nutrientes presentes no material e o tratamento dos grãos são específicos para cada região”, explica Marrafon, que é mestre em máquinas agrícolas pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da Universidade de São Paulo, e doutorando na mesma área pela Universidade Estadual Paulista, campus de Jaboticabal. Segundo ele, a ferramenta pode ser adaptada para várias culturas. “Desde milho e hortaliças, até o fumo.”

Fita-semente
Fita-semente prestes a ser plantada. O novo dispositivo acelera o plantio e promete dobrar a produtividade de vários cultivos. (foto: Mateus Marrafon)

O espaçamento entre as plantas a serem cultivadas também é definido conforme o que é recomendado para cada espécie. A fita ainda permite que sementes de culturas principais e secundárias sejam postas de modo intercalado. Com o tempo, a fibra, que não é poluente, se desintegra no solo, sem afetar o crescimento da planta. Ao contrário, a produtividade pode aumentar em até 50%, como mostraram alguns testes.

Agilidade e eficiência

A semeadura com a fita-semente é mais ágil que a feita com o auxílio de equipamentos mecanizados tradicionais. No caso do milho, por exemplo, a velocidade de plantio é de 6 quilômetros por hora (km/h); usando-se a fita-semente, a velocidade de plantio pode chegar a 20 km/h.

O novo processo garante ainda uma disposição precisa das plantas no campo. Como as sementes são colocadas na fita com espaçamento adequado, o desenvolvimento das mudas após a semeadura é uniforme.

“Outra vantagem é que o uso da fita evita, entre outras falhas, o espaçamento duplo, que pode ser provocado pela vibração da máquina durante a semeadura”, explica Marrafon. “Assim, não haverá sementes mais próximas umas das outras, disputando nutrientes, nem mais distantes, levando à perda de espaço produtivo.”

Plantação de melancia e milho
Melancia cresce em meio a plantação de milho. Nova técnica permite intercalação de sementes de culturas secundárias na fita. (foto: Mateus Marrafon)

Como a fita fica totalmente coberta de terra após o plantio, as perdas ocasionadas pelo ataque de pragas ou de pássaros são desprezíveis. Além disso, as sementes integradas na fita são mais resistentes à estiagem – como mostraram alguns experimentos –, já que a fibra de celulose ajuda a manter a umidade próxima à semente, facilitando a germinação.

Acondicionada em bobinas ao custo de R$0,30 o metro, a fita-semente ainda não tem previsão de entrada no mercado. Marrafon deseja que a ferramenta seja usada para fins sociais e planeja futuras parcerias com o governo federal.
 

Na África

Outro projeto do pesquisador é testar a técnica em solo africano. “Sabemos que o continente dispõe de terra para plantio, mas enfrenta problema na agricultura familiar e sofre com a questão da fome”, justifica.

O pesquisador quer testar a técnica em solo africano, já que o continente dispõe de terra para plantio, mas enfrenta problema na agricultura familiar e sofre com a questão da fome

“Nosso objetivo é minimizar esse quadro de dificuldades.” Para isso, segundo Marrafon, a fita terá que se adequar aos solos da região. As sementes usadas serão as do local, por já estarem adaptadas às condições de cada ambiente.

O projeto da fita-semente foi criado em 2006, quando Marrafon ainda cursava a graduação em engenharia agronômica na Universidade Estadual do Norte do Paraná. Dois anos depois, o trabalho foi reconhecido ao ficar entre os finalistas do prêmio Jovem Inovador, promovido pelo Canal Rural e pela empresa Massey Ferguson.

No final de 2013, a Fundação Bill e Melinda Gates, através do programa Grand Challenges Explorations, disponibilizou 100 mil dólares para o desenvolvimento da técnica. Caso os avanços nos estudos sejam bem avaliados, o financiamento pode ser ampliado para 1 milhão de dólares.

Franciele Petry Schramm
Especial para CH On-line/ PR