Diversidade escondida na Oceania

Por milênios, as cordilheiras e florestas de Papua-Nova Guiné, arquipélago localizado na Oceania, restringiram a interação entre grupos indígenas locais e criaram um dos países de maior diversidade linguística e cultural do mundo. Essas mesmas barreiras foram as responsáveis por limitar, durante muito tempo, explorações científicas nesse território e guardar a sete chaves sua rica biodiversidade.

Mas um projeto recente mudou esse quadro. Durante dois meses de expedição às inóspitas florestas das montanhas Nakanai e da cordilheira Muller, em Papua-Nova Guiné, pesquisadores identificaram mais de 200 novas espécies de animais e plantas. A viagem, realizada em 2009, foi planejada pelas organizações Conservação Internacional e A Rocha Internacional.

“O projeto teve como objetivo documentar em todo o mundo a biodiversidade de ambientes ricos em espécies, mas ainda pouco conhecidos”, afirma o cientista ambiental Martin Kaonga, diretor de Ciências e Conservação da organização A Rocha Internacional. “Também buscamos mobilizar a comunidade local para desenvolver e implementar estratégias de conservação na região.”

Entre os resultados da expedição, anunciados em outubro de 2010, está o registro de 24 espécies de rãs, dois mamíferos, nove espécies de plantas, quase 100 insetos – incluindo libélulas, gafanhotos e formigas – e aproximadamente 100 aranhas, todos novos para a ciência.

Mamífero de Papua-Nova Guiné
Os pesquisadores descobriram uma espécie de rato que representa um gênero de mamífero totalmente novo para a ciência. Sua cauda, comprida e branca, o distingue de todos os outros ratos da região. (foto: Stephen Richards/ CI)

“Alguns desses animais são tão diferentes de outras espécies já conhecidas que representam gêneros totalmente novos”, destaca Kaonga. Nesse grupo estão incluídos pelo menos um mamífero e uma formiga, além de vários tipos de cigarras.

Kaonga ainda ressalta outras duas descobertas: uma nova espécie de begônia; e uma nova espécie do gênero Rhododendron, cujas flores chamaram atenção por alcançarem até oito centímetros de comprimento, o que não é comum para plantas desse grupo.

Planta Rhododendron
Nova espécie do gênero ‘Rhododendron’, cujas plantas estão entre as mais procuradas no sudeste asiático e na Melanésia por causa de seu valor ornamental. (foto: Wayne Takeuchi)

Difícil acesso

Chegar ao interior da floresta tropical localizada sobre as montanhas Nakanai e a cordilheira Muller foi, segundo Kaonga, “um verdadeiro Everest” para a equipe. Os pesquisadores precisaram voar de avião, helicóptero e fazer o resto do trajeto a pé para conseguir alcançar o seu destino final.

Outro grande desafio foi o tempo ruim. “As fortes chuvas afetaram equipamentos e atrasaram a mobilidade do grupo”, conta o cientista ambiental. “Além disso, os nevoeiros causavam problemas constantes e complicavam o pouso do helicóptero na área.”

Se, por um lado, o inóspito terreno de Papua-Nova Guiné gerou contratempos para os pesquisadores, por outro tem servido como um poderoso aliado na conservação dessa e de muitas outras regiões do país.

“O terreno acidentado e montanhoso contribuiu para a proteção dessas espécies por tanto tempo”, reforça Kaonga. “Todas elas estavam em lugares bem remotos e quase inacessíveis”, diz.

Gafanhoto de Papua-Nova Guiné
Gafanhoto recém-descoberto em Papua-Nova Guiné. Em uma amostra relativamente pequena de 42 exemplares desses insetos, os pesquisadores identificaram pelo menos 20 novas espécies. (foto: Piotr Naskrecki/ iLCP)

A documentação das novas espécies permitiu o desenvolvimento de um projeto de conservação ambiental no país. “Buscamos uma estratégia de preservação em conjunto com a comunidade”, explica o cientista. “Além disso, realizamos um trabalho de educação ambiental com a população, para que ela aprecie o valor dos recursos únicos existentes em suas florestas.”

Kaonga espera ainda que os resultados da expedição apoiem as candidaturas das montanhas Nakanai e da cordilheira Muller a membros da lista de patrimônio da humanidade da Unesco. “Também estamos na expectativa de que essas informações levem a uma revisão da lista vermelha de espécies ameaçadas no mundo”, completa.

Confira mais fotos das novas espécies identificadas em Papua-Nova Guiné.

Ana Paula Monte
Ciência Hoje On-line