Do descarte ao reuso

A criação de peças metálicas pelo processo de fundição – em que ligas metálicas no estado fundido são vazadas em moldes até que se solidifiquem na forma desejada – produz grande quantidade de resíduo sólido descartável, conhecido como areia de fundição (ADF). Cerca de 90% desse material podem ser reinseridos no processo produtivo, mas 10% perdem a função e são desprezados. Esse percentual equivale a três milhões de toneladas de ADF descartadas anualmente no Brasil.

Estudo apresentado por Bárbara Samartini Alves em seu mestrado em engenharia ambiental na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) avaliou o potencial de contaminação de 16 amostras de ADF oriundas de 10 indústrias de fundição de Santa Catarina. Nas amostras, Alves analisou – sob orientação da pesquisadora Cátia Carvalho Pinto – 21 tipos de metais, além de diversos compostos fenólicos e hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (derivados da queima do carbono).

As análises revelaram que o potencial de contaminação das substâncias presentes nas amostras é limitado

O potencial de contaminação das substâncias foi avaliado com base em testes que mediram a quantidade de poluentes no extrato lixiviado (isto é, no líquido resultante da lavagem das areias de fundição) e em modelos matemáticos capazes de simular como seria essa lavagem no ambiente ao longo do tempo.

As análises, feitas com base em parâmetros estabelecidos pela Associação Brasileira de Normas Técnicas, pelo Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) e pelo Ministério da Saúde, revelaram que o potencial de contaminação das substâncias presentes nas amostras é limitado. Entretanto, algumas amostras apontaram a presença de metais em quantidades superiores ao limite máximo admitido como índice de prevenção pelo Conama. Embora a pesquisa tenha revelado que, de modo geral, esses resíduos não apresentem perigo, a pesquisadora ressalva que ainda são necessários mais estudos, como testes de toxicidade que utilizem organismos vivos.

Ambientalmente amigável

Antes de ser descartada, a areia é reinserida várias vezes no processo de fundição. Desse modo, uma espécie de desgaste físico-mecânico acaba por torná-la muito fina, dificultando a obtenção da liga necessária para se fazer um molde, o que impede uma nova reutilização desse resíduo no processo.

Após demonstrar o baixo potencial de contaminação das areias de fundição, Alves propõe seu reaproveitamento com outras finalidades. “As ADFs podem substituir com eficiência parte da areia virgem usada na sub-base de estradas e na fabricação de asfalto, tijolos e telhas”, exemplifica a pesquisadora da UFSC.

Tijolos de concreto
A reutilização da areia de fundição em artefatos de concreto é permitida no país. Apesar disso, o reaproveitamento do resíduo ainda é muito baixo. (foto: Bárbara Alves)

Embora o emprego de ADFs em materiais como asfalto e concreto já seja autorizado pela legislação brasileira, o resíduo ainda é muito pouco reaproveitado no país. Normalmente, é lançado em aterros industriais.

Alves acredita que o fato de seu estudo ter revelado o baixo potencial de contaminação das ADFs pode estimular seu reaproveitamento em outros nichos produtivos. Ganham com isso a indústria, que reduzirá despesas com manutenção das ADFs em aterros, e o meio ambiente, que sofrerá menos impactos causados pela extração de areia virgem. No Brasil, cerca de 90% das areias virgens são extraídos do leito de rios.

Franciele Petry Schramm
Especial para a CH On-line/ PR