Escolha radical?

“Eu quis escrever isso para mostrar para outras mulheres que minha decisão de fazer uma mastectomia não foi fácil, mas estou feliz com minha escolha. Minhas chances de desenvolver câncer de mama caíram de 87% para 5%”. O desabafo da atriz Angelina Jolie publicado no jornal americano New York Times tem dividido a opinião pública, impressionada com sua drástica decisão. Especialistas dizem que o procedimento é, sim, uma opção médica, mas não é a recomendação padrão.

Em sua carta aberta, Jolie conta que tomou a decisão de retirar as duas mamas depois que fez um teste genético que detectou uma mutação no gene BRCA1, o que corresponde a uma chance de 60% de desenvolver câncer de mama e até 50% para o câncer de ovário. Levando em conta que a mãe da atriz morreu de câncer de mama, o risco estimado pelos médicos dela foi de 87% de chance de ter a doença.

O oncologista ginecológico Jesus Paula Carvalho, do Instituto do Câncer de São Paulo, explica que a primeira recomendação para quem tem essa mutação e também a mutação no gene BRCA2 é a retirada dos ovários. 

“O câncer de ovário é muito agressivo, então o procedimento padrão para quem tem alguma dessas mutações é retirar os ovários até os 35 anos”, afirma. “No caso da Angelina, ela retirou a mama e evitou um tumor que teria metade de chance de cura, mas deixou os ovários, que, quando apresentam tumores, são quase sempre fatais.”

A primeira recomendação para quem tem essas mutações é a retirada dos ovários até os 35 anos

O médico explica que a remoção dos ovários diminui o risco do câncer de mama em 50%, pois a doença sofre a influência dos hormônios liberados por esse órgão. A retirada somente da mama é uma opção que reduz em 92% o risco da doença, mas não diminui o risco do câncer de ovário. Feita a retirada dos ovários, a recomendação mais comum é que seja feito acompanhamento com mamografia anual a partir dos 30 anos. 

Outra alternativa para o controle do câncer é tomar remédios que reduzem o risco do surgimento da doença. Mas Carvalho destaca que esses medicamentos, além de caros, geram efeitos colaterais.

Testes genéticos

O médico lembra que apenas 10% dos casos de câncer têm origem genética e que as mutações no BRCA1 e no BRCA2 não são comuns. Estima-se que apenas quatro em cada mil mulheres tenham defeitos nesses genes e que, dessas quatro, duas vão desenvolver a doença.

Achatz: “A ansiedade e o medo associados a esses testes são muito grandes, por isso devem ser feitos com aconselhamento prévio e posterior”

A geneticista oncológica Maria Isabel Achatz, do Hospital AC Camargo, em São Paulo, ressalta que o teste só é indicado para pacientes com um histórico que justifique o exame – pessoas que tenham parentes de primeiro grau com as mutações ou com câncer de mama, como no caso de Jolie, e pessoas que tenham tido algum tumor na mama. Também entram nesse grupo mulheres judias da etnia asquenaze, população em que a incidência dessas mutações é maior.

O teste genético para detectar tais mutações não é oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e custa em torno de quatro mil reais em laboratórios privados. Para pedir o teste, é necessária prescrição médica.

Achatz reforça a importância de fazer esse tipo de exame com o acompanhamento de um médico geneticista. “O geneticista é quem melhor sabe interpretar o resultado do teste”, explica. “A ansiedade e o medo associados a esses testes são muito grandes, por isso devem ser feitos com um aconselhamento prévio e posterior. A conversa com o geneticista é determinante para entender o resultado e saber as estratégias de monitoramento e profilaxia, como as cirurgias redutoras de risco.”

Sofia Moutinho
Ciência Hoje On-line