Estudo arqueológico resgata passado colonial de Belém

 A arqueologia é em geral associada à busca em lugares ermos por ossos e artefatos pré-históricos, múmias ou cidades desaparecidas. Mas escavações também podem ser feitas em centros urbanos e contribuir para o resgate de parte da história de grandes metrópoles. É o caso de Belém do Pará, onde foi realizada uma pesquisa arqueológica no Forte do Presépio, um marco da fundação da cidade construído em 1616.

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O Forte do Presépio foi construído em 1616 para defender o então recém-fundado povoado de Feliz Lusitânia (foto: Flavya Mutran)

O estudo, realizado pelo Museu Paraense Emílio Goeldi e pela Secretaria Estadual de Cultura, restaurou a edificação, resgatou nas escavações cerca de 100 mil objetos e fragmentos e identificou estruturas acrescentadas ao forte em diversas reformas ao longo de quase 400 anos e que não eram visíveis a olho nu.

Em 12 de janeiro de 1616, foi fundado pelo português Francisco Caldeira de Castelo Branco um povoado batizado de Feliz Lusitânia. No fim de 1615, Castelo Branco havia sido enviado pela administração colonial para dominar a abandonada região Norte, numa política de ocupação do território para garantir a hegemonia da zona açucareira. Em janeiro de 1616 sua frota adentra o rio Guajará com suas embarcações à vela e remo chamadas bergantins e funda Feliz Lusitânia. Para defender o povoado de invasores estrangeiros foi erguido o Forte do Presépio. Mais tarde, ele cresceria e passaria a se chamar Belém do Pará.

Desde sua inauguração o forte passou por inúmeras reformas, foi durante longo tempo uma área militar e recentemente era apenas um mirante e um local de festas. “Era preciso recuperar o forte e dar a ele novamente sua identidade de importante marco histórico do passado colonial de Belém, de quase quatro séculos de idade” diz o coordenador das pesquisas arqueológicas, Fernando Marques.

 

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Pátio interno do Forte do Presépio, hoje chamado Forte do Castelo de São Jorge

Em seus trabalhos, Marques e sua equipe descobriram estruturas antigas como os alicerces da Capela de Santo Cristo (construída por volta de 1640), que existiram até o final do século 17, pisos em tijoleira e em pedra aparelhada do antigo Corpo da Guarda e datados do fim do século 17 ou vestígios das fundações da casa de pólvora e de quatro rampas de acesso ao terrapleno, local onde se assentavam canhões.

 

Entre os objetos encontrados estão moedas antigas — inclusive uma de ouro de 1752 –, cachimbos, louças em faiança portuguesa e faiança fina inglesa, garrafas de bebida, botões de fardamento, fragmentos de armas etc. O mais surpreendente, no entanto, é que foram achadas no local cerâmicas associadas à cultura indígena — prova da ocupação anterior à chegada dos portugueses. “O Forte do Presépio não é só um marco do passado colonial”, diz Marques. “Ele representa o encontro das culturas portuguesa e indígena, cujas evidências fizemos questão de deixar expostas para a visitação no museu ali instalado.”

Toda a área do Forte do Presépio é hoje o Núcleo Cultural Feliz Lusitânia, composto por três edificações: a Casa das Onze Janelas (um sobrado onde funcionava o antigo Hospital Militar), o Museu de Arte Sacra e o Museu do Encontro, que é o próprio Forte do Presépio.

Denis Weisz Kuck
Ciência Hoje on-line
11/03/03