Explicada diversidade do tamanho de cães

 


Um chihuahua e um dinamarquês lado a lado: dois extremos da grande variabilidade de tamanho do Canis familiaris  (foto: Deanne Fitzmaurice).

Os cães são os mamíferos com a maior variabilidade de tamanho de que se tem notícia: o dinamarquês, com até um metro de altura, e o chihuahua, com menos de 20 cm, fazem parte da mesmíssima espécie. Uma equipe anglo-americana descobriu uma peça importante para explicar essa diversidade que há muito intrigava os cientistas: as raças pequenas têm a mesma alteração em uma seqüência genética no cromossomo 15.

A mutação identificada pelos pesquisadores regula a atividade do gene responsável pela produção do hormônio IGF1 – o fator de crescimento semelhante à insulina-1. Já se sabia que esse gene está envolvido no tamanho do corpo de camundongos e humanos. A descoberta, feita pela equipe liderada por Elaine Ostrander, pesquisadora do Instituto Nacional de Pesquisa do Genoma Humano (EUA), foi apresentada como destaque de capa da revista Science desta semana.

Os cães modernos ( Canis familiaris ) descendem do lobo cinzento e divergiram dessa espécie há pelo menos 15 mil anos. No processo de domesticação pelo homem, foram feitos cruzamentos que privilegiaram determinadas características e deram origem à diversidade que se vê hoje. No entanto, a maior parte das raças conhecidas surgiu apenas nos últimos séculos – inclusive uma que teve importância fundamental no estudo: o cão d’água português.

Essa raça foi criada em Portugal para servir de companhia aos marinheiros na época das grandes navegações. Ela foi escolhida para o estudo pela grande variabilidade de tamanho de seus representantes. Foram analisadas inicialmente amostras genéticas de centenas de cães d’água portugueses. As mutações identificadas foram relacionadas com o tamanho do corpo de 463 animais, até que a equipe decidiu concentrar sua atenção na região do cromossomo 15 em torno do gene IGF1.

Em uma etapa posterior, o estudo foi ampliado para analisar 3241 cães de 143 raças, incluindo algumas muito pequenas (como chihuahua ou lulu-da-pomerânia) e outras muito grandes (entre as quais dinamarquês e são-bernardo). Nessa etapa, os pesquisadores conseguiram determinar uma variante genética compartilhada pelas raças de pequeno porte. Esses animais têm alterações em uma seqüência que regula a atividade do gene IGF1. Os autores mostraram que o bloco genético – ou haplótipo – que compreende o IGF1 e essa seqüência regulatória está fortemente associado com o tamanho dos cães.

Genes envolvidos no câncer
“Entender como os genes controlam o tamanho do corpo em cães nos ensina algo sobre como essa característica é geneticamente programada em humanos”, afirmou Elaine Ostrander em comunicado à imprensa. “Também aumentaremos nossa base de dados sobre genes que provavelmente desempenham um papel em doenças como o câncer, no qual a regulação do crescimento das células se perdeu.” Segundo ela, já foi demonstrado que a família de genes do IGF-1 está envolvida com a suscetibilidade ao câncer de próstata.

A equipe pretende criar camundongos geneticamente modificados com o haplótipo presente nas raças de cachorro de pequeno porte, para avaliar o efeito da mudança sobre o tamanho dos roedores. O grupo pretende ainda identificar variantes genéticas envolvidas em aspectos como o tamanho das pernas ou a forma do crânio dos cães.

Bernardo Esteves
Ciência Hoje On-line
05/04/2007