Fundo do mar conta história da baía da Guanabara

Há 4 mil anos, a mata atlântica ocupava toda a região em torno da baía de Guanabara. O clima era quente e úmido e o local era habitado por homens que não cultivavam a terra. Essas são algumas das conclusões da análise de fósseis de grãos de pólen feita por um grupo de pesquisadores sob orientação da bióloga Monika Barth, no Departamento de Geologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). 

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A seta indica a região da baía em que foi recolhido o material analisado

As amostras de pólen foram retiradas de um sedimento recolhido do fundo da baía de Guanabara a 2,22 m profundidade. Esse sedimento faz parte de um testemunho (coluna de terra) colhido ao norte da ilha de Paquetá por uma equipe da Universidade Federal Fluminense (UFF). A datação, feita com carbono-14, revelou que o sedimento tinha uma idade de cerca de 4260 anos. “Esta é a primeira datação de um sedimento da baía”, conta Barth.

 

Após separar o pólen do resto da matéria orgânica, os pesquisadores puderam identificar famílias e gêneros de plantas que habitaram e ainda são encontradas naquela região, como as euforbiáceas, ulmáceas, lecitidáceas, meliáceas e ocnáceas. “A maioria dos grãos eram de árvores de floresta tropical”, afirma Barth. Pólen de pequenos arbustos e esporos de samambaias também foram encontrados.

 

O pólen chegou até o fundo da baía levado pelo vento e pelos rios da região. “Quando chovia, a água carregava os grãos para os rios”, diz a bióloga. Como essa porção da baía é de relativa baixa energia — não tem muita corrente se comparada com o canal central –, o pólen ficou preservado. Essas conclusões foram publicadas em setembro nos Anais da Academia Brasileira de Ciências.

 

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Grãos de pólen de espécies típicas da mata atlântica encontrados na baía de Guanabara, pertencentes à família das euforbiáceas (esq.) e das meliáceas

As espécies identificadas eram de vegetação nativa, o que mostra que os homens que ali moravam não conheciam a agricultura. “Não encontramos plantas de cultivo humano, como milho”, observa Barth. Os habitantes se alimentavam da caça, de frutos das árvores, peixes e de moluscos.

 

Ao contrário do que esperavam, os pesquisadores não encontraram pólen característico de região de mangue (vegetação que ainda existe em torno da baía). O mangue é formado quando o nível de mar diminui e, naquela época, o nível do mar estava cerca de 1 metro mais baixo que hoje. No entanto, como esse tipo de pólen é difícil de ser detectado, poderia haver vegetação de mangue na época estudada mesmo que seus grãos de pólen não tenham sido encontrados.

 

A análise dos sedimentos foi realizada para a dissertação de mestrado de Cíntia Barreto, defendida em junho no Departamento de Geologia da UFRJ. Até o final do ano, os pesquisadores pretendem analisar os outros sedimentos do testemunho para revelar as características do clima e da vegetação da baía de Guanabara de cerca de 4 mil anos atrás até os dias de hoje.

 

Leia na internet o artigo da equipe de Monika Barth

Eliana Pegorim
Ciência Hoje On-line
28/09/04