Genes do orgasmo feminino?

Baseados no resultado de questionários sobre a vida sexual de gêmeas, pesquisadores na Inglaterra concluíram que a incapacidade feminina de atingir o orgasmo pode sofrer influência de sua bagagem genética. Divulgada pela revista Biology Letters , a pesquisa deu margem à interpretação de que as mulheres devem culpar seus genes caso não consigam alcançar o prazer. Porém, ela apenas abre uma nova frente de estudo sobre esse distúrbio, até então somente relacionado a fatores culturais e psicológicos. 

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O nascimento de Vênus , de Sandro Botticelli.

Confidencialmente, 1.697 pares de gêmeas responderam com que freqüência chegavam ao orgasmo, tanto em relações sexuais quanto na masturbação. O grupo de voluntárias foi dividido entre gêmeas idênticas que apresentam os mesmos determinantes genéticos (univitelinas ou monozigóticas) e gêmeas com bagagens genéticas diferentes (fraternas ou dizigóticas).

Comparando os questionários preenchidos, foi detectada uma maior porcentagem de respostas coincidentes entre as irmãs idênticas do que entre as gêmeas fraternas. Partindo do princípio de que cada par de irmãs participante – independentemente de elas serem idênticas ou não – foi criado nas mesmas condições ambientais, familiares e culturais, concluiu-se que a maior distinção entre as respostas das dizigóticas seria decorrente das diferenças em seus genes.

Ao calcular a diferença entre a porcentagem de respostas semelhantes das gêmeas dizigóticas e a das monozigóticas, os pesquisadores chegaram a um grau de “herdabilidade” igual a 34% para relações sexuais e a 45% para a masturbação. Esses números significariam o nível de participação da variação genética na diferença da capacidade das mulheres obterem o orgasmo.

No entanto, essa influência estatística, além de considerada baixa (menos de 50% em ambos os casos), pode sofrer distorções em função da amostra utilizada. A característica também pode não ser determinada por genes específicos, mas pela combinação de vários genes, sendo que, para determinar isso, seria preciso um mapeamento muito detalhado, algo distante da realidade, sobretudo quando se trata de uma característica tão difícil de padronizar como o orgasmo. “A estimativa de ’herdabilidade’ de características físicas é muito importante em organismos de interesse econômico – animais com destino à alimentação, por exemplo –, para justificar um programa de melhoramento genético”, esclarece Mônica Bucciarelli Rodriguez, bióloga da Universidade Federal de Minas Gerais. “Características humanas como o orgasmo feminino são muito mais complexas.”

Durante séculos considerado como tabu em nossa cultura, o orgasmo feminino começou a ser objeto de interesse científico apenas na década de 1960, quando se especulou que ele teria alguma função na fecundação. “Como o orgasmo dos homens tem um claro papel reprodutivo, a impotência masculina é muito mais estudada do que a disfunção sexual feminina”, explica Tim Spector, coordenador da pesquisa. Até hoje o assunto oculta muitos mistérios. O estudo realizado em Londres é somente uma tentativa válida de desvendá-los.

Lia Brum

Ciência Hoje On-line
20/06/05