Grãos e flores produzidos a partir do esgoto

As águas do esgoto, se forem devidamente tratadas, podem cultivar milho hidropônico para alimentar o gado com produtividade maior do que os métodos convencionais, como mostra um estudo realizado na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Essa técnica evita a poluição ambiental e diminui a exploração dos mananciais. A pesquisa também testou com sucesso o reaproveitamento desses efluentes para produção de flores como beneditas, cravos e cravinas por hidroponia.

Flores hidropônicas como cravos (esq.) e cravinas foram cultivadas na UFRN com água de esgoto reaproveitada

Atualmente, a hidroponia — técnica de cultivo que substitui o solo por nutrientes dissolvidos em meio aquoso — é feita com compostos químicos. “Esse tipo de solução é cara, poluente e exige mão-de-obra especializada”, explica Cícero Onofre, engenheiro e sanitarista da UFRN e um dos autores do estudo. “Após o tratamento do esgoto, o líquido restante é composto de água e nutrientes fundamentais para o desenvolvimento de vegetais.”

Os nutrientes presentes nas águas residuárias funcionam como adubo e provocam crescimento da produção. Na UFRN, os cientistas conseguiram colher 20 kg de milho para forragem em hidroponia por metro quadrado a cada 15 dias. O reúso da água também reduz o custo de manuseio dos efluentes.

“É uma forma de dar um fim produtivo ao esgoto”, comemora Onofre. O engenheiro conta que um litro de esgoto é capaz de poluir até 100 litros de água. “Com o reaproveitamento dos efluentes, é possível economizar não só a quantidade de água necessária para a produção, como evitar a degradação de um imenso volume de recursos hídricos.”

 

O cultivo de milho hidropônico para forragem dispensa agrotóxicos, tem alta produtividade, ciclo curto e contínuo e baixos custos de produção

Os pesquisadores da UFRN utilizaram filtros anaeróbios no tratamento dos esgotos. O filtro é formado por um enchimento pelo qual passa a água do esgoto. Esse enchimento retém os sólidos e armazena uma população de bactérias, que degradam a matéria orgânica ali acumulada. O produto dessa degradação são nutrientes como nitrogênio, fósforo e potássio, que são liberados junto com a água. Há ainda pequenas concentrações de cálcio, magnésio, enxofre, cobre, ferro, manganês e zinco.

 

Cada tipo de cultura requer uma determinada técnica de tratamento de esgoto. “As doenças que atingem o gado são diferentes das nossas, então a qualidade da água pode ser mais baixa”, compara Onofre. O agricultor também precisa adequar os métodos de irrigação e manejo. Os cuidados de proteção individual devem ser adaptados ao tipo de água residuária para evitar problemas de saúde.

Além do milho para forragem e das flores hidropônicas, os pesquisadores utilizaram o esgoto tratado para irrigação de culturas de girassol e arroz. As pesquisas sobre irrigação e hidroponia com esgoto tratado na UFRN são desenvolvidas no âmbito do Programa Nacional de Pesquisas em Saneamento Básico (Prosab).

Eliana Pegorim
Ciência Hoje On-line
05/08/04