Um estudo conduzido com moradores de uma comunidade isolada dos Andes, no Equador, que possui alta incidência de nanismo, mostra que essa mutação genética pode estar relacionada à diminuição do risco de câncer e diabetes. Em um futuro próximo, a descoberta pode ser usada na prevenção dessas doenças.
A pesquisa, publicada recentemente na Science Translational Medicine, documentou os casos das duas enfermidades na população da província de Loja durante 22 anos. No total, 1.600 pessoas foram analisadas, sendo que 99 delas possuíam a síndrome de Laron, uma deficiência genética rara que inibe a ação do hormônio do crescimento.
Durante todo o período do estudo, os pesquisadores não registraram sequer um caso de diabetes entre os portadores da síndrome e notaram que apenas um indivíduo desenvolveu câncer, ainda assim, não letal. Já entre as pessoas de estatura normal, 5% foram diagnosticadas com diabetes e 17% com câncer, estatísticas consideradas habituais.
Os pesquisadores concluíram que a baixa atividade de hormônio do crescimento dos indivíduos com nanismo diminui o risco de câncer e os torna mais tolerantes à insulina, o que impede o diabetes tipo 2, doença causada pela resistência do organismo a essa substância.
O líder do estudo, o médico Jaime Guevara-Aguirre, do Instituto de Endocrinologia, Metabolismo e Reprodução do Equador, conta que descobriu essa curiosa população em 1987 e que, desde então, estuda a ligação do nanismo com a ausência de doenças ligadas ao envelhecimento.
“Notei que esses meus pacientes não tinham câncer, enquanto que seus parentes tinham, mas na época me disseram que era um grupo muito pequeno para se tirar alguma conclusão e, por isso, esperei todos esses anos para publicar a pesquisa junto com Valter Longo”, conta Guevara-Aguirre.
Valter Longo, da Universidade do Sul da Califórnia, é o segundo autor do estudo. De acordo com o pesquisador, a descoberta pode ajudar no desenvolvimento de novos medicamentos de redução do hormônio do crescimento para prevenção de câncer, diabetes e outras doenças, como o acidente vascular cerebral.
“Ainda precisamos realizar mais estudos clínicos, mas potencialmente não estamos muito longe disso”, afirma Valter Longo.
O médico defende que essas drogas, quando prontas, deveriam ser usadas primeiramente em pessoas com histórico familiar de câncer e diabetes e que não tenham idade avançada, pois a produção do hormônio do crescimento cai naturalmente conforme envelhecemos.
Pesquisas anteriores com camundongos já haviam demonstrado que a inibição do hormônio do crescimento estava relacionada à diminuição do risco de câncer e a uma vida mais longa. O diferencial do estudo de Guevara-Aguirre e Longo é comprovar que o mesmo acontece com humanos.
Os cientistas ainda não sabem dizer ao certo por que a redução do hormônio impede o câncer. Para Longo, uma possível explicação é que, como as células dos portadores de nanismo não crescem tanto, elas investem sua energia na autoproteção. Mas, para comprovar essa hipótese, mais pesquisas são necessárias.
Sofia Moutinho
Ciência Hoje On-line