Os formandos em luteria de 2014 pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) – quarta turma a concluir o curso de graduação desde a sua criação, em 2009 – se despediram da universidade em grande estilo: com um espetáculo em que músicos profissionais de Curitiba utilizaram instrumentos produzidos pelos nove estudantes recém-formados.
Entre os instrumentos utilizados no concerto, estão duas violas caipiras, um violão romântico, um violão de aço, uma guitarra acústica, um violino norueguês (conhecido como Hardanger fiddle), uma viola clássica e um bouzouki, instrumento de cordas muito popular na música tradicional da Grécia. Foi utilizado também um instrumento novo, que funde o violão com o baixo, criado por um dos estudantes.
O luthier (ou lutier) é um profissional especializado em construir instrumentos de corda. Isso inclui o violão, violinos, violoncelos, contrabaixos, violas, vários tipos de guitarra (acústica, elétrica, clássica), alaúdes, bandolins e harpas.
Ao desenvolver os instrumentos, os estudantes fizeram adaptações em alguns deles, como aberturas (ou bocas) laterais, que são uma tendência atual no Brasil. “Uma das violas e o violão de aço trazem essa inovação”, conta o luthier Lucas Guilherme Schashauser. Ao executar instrumentos com essa característica, o músico consegue captar o retorno do som com mais qualidade.
Em vez de liberar o som apenas para frente, o instrumento com boca lateral o libera também para cima, explica Schashauser. “Desse modo, em uma formação com vários músicos, um violonista ou violeiro percebe melhor o som que está produzindo.”
Schashauser lembra, no entanto, que a boca lateral não é uma invenção sua e de seus colegas de curso na UFPR. Instrumentos com essa característica já são utilizados em alguns países. “Mas raramente no Brasil”, destaca.
Nos violões construídos pelos novos luthiers, parte da madeira do tampo foi substituída por fibra de carbono; a madeira dos leques (travessas localizadas na parte de dentro do tampo) recebeu apenas um filete dessa fibra. Segundo Schashauser, a mudança garante melhor timbre e projeção, e maior vida útil ao instrumento, já que o material é mais resistente.
Assista ao vídeo com apresentação do ‘monstrolão’ na UFPR
Customização e invenção
A construção de instrumentos musicais envolve vários tipos de madeira, tarraxas de metal e cordas de aço, e o tempo de construção varia de acordo com o objeto a ser construído. Um violão, por exemplo, pode levar até seis meses para ficar pronto, enquanto uma guitarra elétrica pode ser concluída em duas semanas.
Um instrumento feito por um luthier costuma ganhar modificações. Ao contrário do que acontece quando é produzido em escala industrial, o instrumento elaborado artesanalmente permite mais personalização.
A construção de instrumentos não envolve apenas aqueles que já existem. É possível também criar instrumentos novos – como é o caso do ‘monstrolão’, desenvolvido pelo luthier Dagoberto Luiz Koutton. A invenção resultou da fusão de características do violão e do baixo.
Koutton relata que sempre teve curiosidade de entender o funcionamento da escala em leque, que se originou da fusão de escalas com comprimentos diferentes.
“No Brasil, praticamente não há instrumentos assim, cujas possibilidades de aplicação são enormes”, diz. Segundo Koutton, o monstrolão une dois instrumentos diferentes numa só escala, que são as cordas no braço do instrumento. Seu nome oficial é ‘violão e baixo híbrido de oito cordas’.
A invenção surgiu a partir de pesquisas na internet, quando Koutton deparou com a imagem de uma guitarra que tinha também cordas de contrabaixo – o conceito básico de seu instrumento. Mas ele nunca encontrou informações que o ajudassem a construir um objeto como aquele. “Tive praticamente que reinventar a roda”, declara. O monstrolão levou quatro meses para ficar pronto, após longo tempo de trabalho de pesquisa.
A UFPR é a única universidade pública do Brasil que oferece um curso de graduação em luteria, com 30 vagas por ano. A duração do curso é de três anos. O trabalho do luthier envolve, além da construção, a restauração de instrumentos danificados.
Carol Sokodolski
Especial para a CH On-line/ PR