Menos individualismo, mais colaboração

 

Cerca de 30% dos trabalhos científicos produzidos no Brasil contam com a cooperação de autores estrangeiros. A visibilidade desses estudos na comunidade científica é maior do que a dos outros – mais de 80% dos artigos com 100 citações ou mais na literatura são frutos de colaborações. Contudo, essa interação ocorre principalmente com os Estados Unidos e países europeus. Apesar da proximidade geográfica e cultural com as nações da América Latina e do Caribe, no campo da ciência a distância é grande. A Argentina, o maior colaborador, só está presente em 6% dos trabalhos desenvolvidos no Brasil.

Cartaz do evento que reuniu, no Rio de Janeiro, autoridades e representantes da comunidade científica de países da América Latina e do Caribe para estimular a cooperação regional na área.

Discutir maneiras de mudar essa situação foi o objetivo do simpósio ‘Ciência no Brasil e na América Latina’, organizado pelas academias Brasileira de Ciências (ABC) e de Ciências para o Mundo em Desenvolvimento (TWAS) e realizado no Rio de Janeiro na semana passada. Para o presidente da ABC, o médico Eduardo Moacyr Krieger, a prioridade é promover o intercâmbio entre os países latino-americanos e caribenhos. “É importante ter uma pesquisa nacional independente, mas também é necessário aproveitar as oportunidades de troca e complementação de conhecimento”, afirma.

Para ele e outros representantes da comunidade científica presentes no encontro, a intensificação das colaborações requer a articulação maior dos cientistas com o governo. “Temos que definir áreas, indicar pesquisadores e apresentar projetos mais sistêmicos. Em suma, temos que montar o sistema”, explica Krieger. Segundo o presidente da ABC, sem o diálogo das lideranças científicas com os políticos, essa iniciativa está dispersa.

O ministro da Ciência e Tecnologia, o físico Sergio Rezende, ressaltou que já existem recursos disponíveis para a cooperação internacional, como o Programa Sul-americano de Apoio às Atividades de Cooperação em Ciência e Tecnologia (Prosul), criado pelo ministério e operado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) por meio de editais. Na opinião de Rezende, o que falta é um gerente de programa. “Sem gerenciamento, fica mais difícil definir claramente os objetivos.”

O matemático Jacob Pallis, presidente da TWAS, concorda com o ministro. “Não é preciso criar mais mecanismos e sim prestar mais atenção aos já existentes”, defende. Além do Prosul, ele cita as bolsas que o CNPq e a TWAS oferecem em conjunto para alunos de doutorado, pós-doutores e pesquisadores visitantes. Ele ressalta ainda a necessidade de um maior cuidado no recebimento dos estudantes estrangeiros e sugere que outros países, como o México e o Chile, criem programas semelhantes de fomento.

O cenário no resto da América Latina e no Caribe é similar ao do Brasil, de acordo com os representantes de Chile, Peru, Venezuela, México e Cuba. A astrônoma mexicana Silvia Peimbert acredita que, para estimular o intercâmbio, os países podem ser mais generosos com suas instalações e seus equipamentos únicos, como o Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), em Campinas (SP), e o Grande Telescópico Milimétrico mexicano, permitindo visitas de um ou dois meses. “Temos que ser mais criativos e menos individualistas”, conclui.

Fred Furtado
Especial para Ciência Hoje On-line
02/02/2007