Movidos a cifrões

Quem nunca ouviu a frase: ‘O dinheiro é a mola que move o mundo’? Pois o dito popular parece se concretizar mais uma vez, em uma competição lançada por uma agência do Departamento de Defesa dos Estados Unidos que exigia um alto grau de mobilização social para a realização de uma tarefa. A equipe que ofereceu dividir o valor do prêmio entre as pessoas que a ajudassem a vencer o desafio foi a ganhadora, superando – por pouco – um time que apostou no altruísmo dos estadunidenses.

O desafio, anunciado em outubro de 2009 pela Agência de Projetos de Pesquisa Avançada de Defesa (Darpa), consistia em localizar, no menor tempo possível, 10 balões meteorológicos vermelhos que seriam lançados no início de dezembro do mesmo ano em diferentes pontos do território dos Estados Unidos. A competição, organizada para comemorar os 40 anos da internet, tinha como intuito explorar o potencial da web e a dinâmica das redes sociais na comunicação.

A equipe vencedora obteve as coordenadas geográficas dos 10 balões em 8 horas e 52 minutos

Em artigo publicado na Science, a equipe vencedora, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), explica a estratégia que lhe permitiu ser a mais rápida a executar a tarefa: ela obteve as coordenadas geográficas dos 10 balões em 8 horas e 52 minutos. A proposta foi usar os 40 mil dólares do prêmio em dinheiro que seria dado ao vencedor para recompensar não apenas as pessoas que localizavam os balões, mas também aquelas que conectavam essas pessoas à equipe.

O grupo prometeu dar 2 mil dólares para a primeira pessoa a enviar as coordenadas corretas de cada balão e mil dólares para aquela que convidou a pessoa que encontrou o balão a se juntar ao time. Essa cadeia de ‘incentivos’ prosseguiria: sempre que uma pessoa recebesse um prêmio por qualquer razão, quem a indicou ganharia um valor equivalente à metade da quantia.

Para o desafio, o grupo criou um site onde qualquer pessoa poderia se registrar para se tornar membro e informar a localização de um balão. Após o registro, o usuário recebia um link único, por meio do qual poderia convidar amigos a se juntar à equipe do MIT. Segundo os autores, muitos usuários enviaram o link por e-mail para seus amigos, mas outros usaram as mídias sociais (como Twitter e Facebook).

Os representantes do MIT começaram a divulgar o desafio dois dias antes da competição, quando enviaram o link de seu site para amigos próximos e alguns blogues. Aproximadamente 36 horas antes do lançamento dos balões, o grupo já tinha conseguido recrutar quase 4.400 pessoas.

Veja abaixo como se estabeleceu a rede de recrutamento da equipe do MIT e quais caminhos (em amarelo) levaram à localização dos balões (vídeo: Wei Pan)

“Nossa abordagem foi baseada na ideia de que alcançar mobilização em larga escala exige incentivos em nível individual tanto para executar a tarefa como para se envolver ativamente no recrutamento adicional de outros indivíduos por meio de suas redes sociais”, dizem os pesquisadores no artigo.

Nem tudo está perdido

O time que ficou em segundo lugar, do Instituto de Tecnologia da Geórgia (Georgia Tech), conseguiu mobilizar 1.400 pessoas e localizou nove balões em nove horas – um desempenho animador, especialmente se considerarmos que não haveria qualquer vantagem financeira para quem ajudasse a equipe. Para conquistar adesões, o grupo disse que doaria todo o dinheiro do prêmio para a Cruz Vermelha Americana.

O time que ficou em segundo lugar conseguiu mobilizar 1.400 pessoas e localizounove balões em nove horas

Os pesquisadores do MIT acreditam que o bom rendimento do time vice-campeão se deva ao fato de ter iniciado cedo a sua estratégia, à cobertura da mídia e à otimização de suas buscas.

A análise da presença da equipe do Georgia Tech no Twitter apontou um número pequeno de menções em resposta à estratégia do grupo, o que, segundo os cientistas vencedores, sugere que confiar apenas na propagação por motivos altruístas não é suficiente para conseguir uma ampla mobilização social. Já a equipe do MIT obteve aproximadamente 100 milhões de menções no Twitter entre 10 de novembro e 9 de dezembro de 2009.

O cientista político José Eisenberg, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, ressalta que o altruísmo define-se pelo desejo de bem-estar do outro e que esse comportamento é similar ao egoísmo – apesar do que se costuma pensar. “Na medida em que o altruísta também busca seu próprio bem-estar na forma do bem-estar alheio, ele é tão ‘egoísta’ quanto o tipo supostamente polar que busca somente seu próprio bem-estar”, esclarece.

Entre os primeiros colocados no desafio (que teve 58 equipes classificadas), além dos grupos já mencionados, dois encontraram oito balões e cinco acharam sete balões. Segundo os pesquisadores do MIT, as variações nas estratégias adotadas pelos competidores refletiram as diferenças no modo como as mídias sociais podem ser usadas para mobilizar pessoas em torno de uma tarefa.

Para os autores, a estratégia desenvolvida por eles pode ser aplicada em diferentes situações que exijam informar e recrutar rapidamente um número muito grande de pessoas, como a mobilização social para lutar contra a fome no mundo e campanhas de marketing. Resta saber qual seria o tipo de ‘incentivo’ usado em cada uma dessas causas e se ele teria o mesmo efeito que o dinheiro.

Thaís Fernandes

Ciência Hoje On-line