Ouvir música pode alterar a sensação gustativa e o estado de ânimo de crianças. Essa foi a conclusão da dissertação de mestrado da psicóloga Viviane Freire Bueno, desenvolvida no Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. Durante o trabalho, a pesquisadora procurou analisar o grau de percepção musical de meninos e meninas e como os estímulos musicais do ambiente são capazes de transformar o seu ânimo.

Bueno selecionou 83 crianças entre cinco e dez anos para que provassem duas soluções (chamadas de sucos), uma preparada com sacarose e outra com cafeína. Em um primeiro momento, os pequenos tomaram os sucos e os classificaram como ‘doce’ ou ‘amargo’ e ‘gostoso’ ou ‘não gostoso’. Depois, a pesquisadora colocou uma música e as crianças responderam se a consideravam ‘alegre’ ou ‘triste’. Ainda escutando a canção, os participantes tomaram novamente as soluções para classificá-las mais uma vez. Antes e depois de ouvir as músicas, os meninos e meninas também responderam a outra pergunta: ‘quem bebeu?’. Na resposta, eles deveriam apontar uma face feliz ou uma triste.

Durante o processo, a psicóloga pediu às crianças que prestassem atenção tanto no sabor das bebidas quanto no que ouviam, a fim de que o resultado fosse a relação entre os dois estímulos. Em muitos casos, a sensação gustativa e o estado de ânimo se modificaram após a audição da música, especialmente quando ela contrastava com as impressões iniciais, ou seja, canção triste e sabor doce ou canção alegre e sabor amargo.

Na combinação sabor doce e música triste, por exemplo, 50% das crianças na faixa de cinco e seis anos mudaram seu humor, indicando a face triste após a canção. Já na idade entre nove e dez anos, esse número sobe para 85%. “Os dados indicam que a estimulação triste pode ter mais influência sobre o estado de ânimo do que o sabor doce”, afirma Bueno. Outra informação significativa é o fato de que 54% das crianças entre nove e dez anos, ao ouvirem uma música alegre, também alteraram seu estado de ânimo, inicialmente triste por causa do gosto amargo do suco.

Segundo a pesquisadora, as crianças mais novas demonstraram ser mais sensíveis ao sabor amargo do que à música triste, enquanto as mais velhas afirmaram ser igualmente influenciadas pelos dois fatores. “Isso é decorrente de um maior desenvolvimento na percepção sensorial das mais velhas”, explica. “As menores são muito influenciadas pelo sabor amargo; por isso, ele se sobressai. Entretanto, quando foram testadas na combinação sabor doce e música alegre, a canção foi mais importante, pois elas ficam mais interessadas no que está acontecendo ao seu redor.”

Bueno supõe que as escolhas das crianças sejam influenciadas, entre outros motivos, por suas experiências de vida. “Um menino achou que o suco amargo era dipirona e, por isso, o considerou gostoso, já que este é o remédio que sua mãe lhe dá quando está doente”, exemplifica.

Mariana Benjamin
Ciência Hoje On-line
21/11/2006