Macaco comanda braço mecânico com pensamento

Eletrodos implantados no cérebro de macacos permitem que eles movam um braço mecânico apenas com sinais nervosos. Parece filme de ficção científica, mas a façanha foi realizada por pesquisadores da Universidade Duke (EUA). Esse é o primeiro passo para a incorporação de equipamentos eletrônicos no tratamento de doenças, o que seria um grande avanço na recuperação de pessoas paralíticas ou que sofreram derrame cerebral.

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Miguel Nicolelis (de óculos) e José Carmena,
membros da equipe da Universidade Duke

O estudo, coordenado pelo neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis, foi publicado na primeira edição da revista eletrônica Public Library of Science – Biology (PloS Biology). Sua equipe demonstrou como duas fêmeas de macaco rhesus foram capazes de aprender a manipular um braço mecânico por meio de dispositivos de interface entre cérebro e máquina (BMIs na sigla em inglês).

Antes de começar os testes com os BMIs, os cientistas treinaram durante meia hora os macacos para realizarem tarefas que consistiam em alcançar e segurar objetos representados num monitor (a essas ações correspondia o movimento de um braço mecânico real). Nessa primeira fase, a manipulação dos objetos era controlada por um joystick .

Durante os testes, foram medidos e registrados pelos eletrodos implantados nos macacos os tipos de sinais cerebrais que indicavam a posição, força e velocidade da mão e os eletromiogramas de diversos músculos (registro gráfico dos potenciais elétricos gerados pelo músculo durante sua ativação).

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Clique na imagem acima para ver uma animação do experimento
(imagens: Universidade Duke)

Numa segunda etapa, a ação passou a ser controlada diretamente pelos sinais cerebrais dos macacos (mediados pelos BMIs), e não mais pelo joystick. Esses sinais eram decodificados matematicamente por um computador graças à comparação com o registro anterior dos parâmetros motores. Por algum tempo, os animais continuaram mexendo o joystick , mas logo aprenderam que não precisavam comandá-lo para mover os objetos no monitor e, assim, manipular o braço mecânico.

A análise dos sinais cerebrais mostra que os macacos assimilaram o braço mecânico como se fosse seu próprio membro, o que mostra a grande plasticidade de seu cérebro. A incorporação de ferramentas como extensão do organismo também ocorre em seres humanos. Carros, por exemplo, estão tão inseridos em nosso cotidiano que são percebidos como extensão de nosso corpo.

Com a análise dos sinais nervosos durante os testes, os cientistas perceberam que os circuitos cerebrais se reorganizavam para se adaptar à nova situação. As propriedades fisiológicas dos neurônios mudavam quando o modelo de controle era transferido, o que reflete mais uma vez a maleabilidade do cérebro mesmo em indivíduos adultos e não só em jovens, como se imaginava anteriormente.

Embora ainda não esteja claro em que regiões do cérebro os eletrodos devem ser instalados para a execução eficaz do movimento, os pesquisadores sugerem que as mais indicadas seriam as áreas frontal e parietal, pois o comando de movimentos musculares complexos se dá nessas regiões.

Liza Albuquerque
Ciência Hoje On-line
17/10/03