No caminho certo

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Djalma Pereira, professor da UFPR

Embora pouco conhecida, a indústria de pavimentação está em constante crescimento e apresenta novidades tecnológicas que prometem transformar o setor. Algumas dessas inovações foram discutidas por especialistas brasileiros e estrangeiros durante a 36ª Reunião Anual de Pavimentação, realizada em agosto passado no Centro Integrado de Empresários e Trabalhadores das Indústrias do Estado do Paraná, em Curitiba. Paralelamente à reunião, a Associação Brasileira de Pavimentação, que organizou o evento, promoveu a 1ª Feira de Novas Tecnologias Rodoviárias.

 
Em entrevista à Ciência Hoje On-line , o coordenador da reunião e da feira, Djalma Martins Pereira, professor titular do Departamento de Transportes da Universidade Federal do Paraná (UFPR), salientou as inovações que se incorporam à indústria de pavimentação – um mercado estratégico que movimenta milhões de dólares em todo o mundo – e a preocupação dos pesquisadores da área em trilhar vias que combinem preços competitivos com respeito ao meio ambiente.
 

 

Quais foram, em sua opinião, os principais destaques da 36ª Reunião Anual de Pavimentação?

Saliento a conferência do engenheiro norte-americano Keith Steffens sobre o uso de polímeros industriais na modificação do ligante asfáltico – o elemento que dá coesão às misturas asfálticas. Esses polímeros, cada vez mais empregados nos Estados Unidos, aumentam significativamente a durabilidade do pavimento. Destaco também a palestra do engenheiro sul-africano Chris Potgieter, que abordou a experiência positiva do emprego de misturas com uso de asfalto-borracha em seu país. A incorporação da borracha de pneus inservíveis ao ligante asfáltico para melhorar suas características é uma tecnologia emergente no Brasil. Mas na África do Sul e em alguns outros países os avanços nesse sentido são muito mais expressivos do que aqui.
 
E a participação brasileira no evento?
Foi bastante proveitosa a conferência da professora Leni Leite, do Centro de Pesquisas da Petrobras (Cenpes), que tratou das novas especificações brasileiras para cimentos asfálticos. Há um grande clamor do mercado brasileiro por asfaltos de melhor qualidade. Mas a Petrobras, que tem o monopólio do refino de petróleo no país, decidiu que, em pouco tempo, passará a refinar apenas petróleo nacional. Do ponto de vista comercial, isso significaria a nossa independência em termos de refino do combustível. Mas é preciso lembrar que o nosso petróleo não é dito ‘de base asfáltica’, ou seja, não é o mais adequado para a produção de pavimento. O óleo venezuelano, por exemplo, ajusta-se muito mais a esse fim. A divulgação das novas especificações foi, portanto, muito oportuna por revelar as mudanças na área.
 
Que novidades mostrou a Feira de Novas Tecnologias Rodoviárias?
Os expositores exibiram o que há de mais moderno em termos de ligantes asfálticos, tubos de drenagem e sinalização, além de maquinário empregado nas áreas de construção, reciclagem e avaliação de pavimentos. A feira deu a empresas de produtos rodoviários, principalmente ligados a asfalto, oportunidade de divulgar suas novidades não só a especialistas, mas também a um público mais amplo, já que foi grande o número de pessoas que a visitaram. Talvez a feira tenha sido tão importante quanto a plenária da reunião.
 
Os novos ligantes alfálticos seriam, então, a grande inovação no campo das novas tecnologias rodoviárias?
A modificação de ligantes é, sem dúvida, a grande novidade do momento na área de novas tecnologias rodoviárias, pois apresenta soluções mais duráveis em matéria de revestimento. Mas nos últimos anos surgiram também outras técnicas inovadoras para a recuperação de pavimentos, como o microrrevestimento asfáltico, que começou a ser utilizado em rodovias paranaenses na época do programa de concessões de trechos de rodovias ao setor privado. O processo envolve a aplicação sobre o pavimento de uma mistura composta por emulsão modificada com polímeros, agregados miúdos e fibras, em uma espessura de aproximadamente 10 milímetros. Isso não chega a dar um aporte estrutural nem aumenta a vida útil do pavimento, pois não se trata de um recapeamento propriamente dito. Mas, devido à impermeabilização que dá à superfície, permite maior resistência. Sem falar no evidente rejuvenescimento que confere ao pavimento.
 
Quais as novidades sobre sistemas de drenagem?
No que diz respeito a drenagem, uma novidade são os chamados geossintéticos, elementos de reforço, semelhantes a telas ou grelhas, que funcionam como filtros, impedindo que a água leve a parte fina do solo para dentro da tubulação. Em alguns casos esses elementos podem ser usados em pavimentação. Se o recapeamento for feito sobre um pavimento trincado, há chances concretas de essas falhas se propagarem ao longo da nova mistura. Com poucos meses de tráfego elas devem reaparecer na superfície. Portanto, no caso de pavimentos trincados, os geossintéticos, impregnados com ligante asfáltico, podem ser aplicados antes do recapeamento, atuando no sentido de retardar ou evitar a propagação de trincas. Outra tendência mundial relacionada com tubos de drenagem é o emprego de materiais plásticos como policloreto de vinila, o PVC, e polipropileno. Esses produtos vêm substituir, na drenagem subterrânea, os tubos de concreto e cerâmica, que exigem junções e conexões de difícil manuseio. Eles são perfurados para permitir a entrada de água e podem ser enrolados. São leves, fáceis de embalar, instalar e fazer juntas, além de terem um excepcional controle de qualidade, pois são produzidos industrialmente.
 
O que há de novo na área de equipamentos de construção viária?
O destaque deve ser dado às máquinas recicladoras, tanto pela moderna tecnologia que envolvem, quanto por seu caráter, digamos, ‘ambientalmente correto’. O Brasil possui uma malha rodoviária de grande extensão expressivamente deteriorada [ver ‘Panorama desolador‘]. Se continuarmos explorando pedreiras e jazidas para obter matéria-prima necessária à recuperação dessa malha, estaremos agredindo a natureza, e isso não é mais aceitável. A melhor solução é reciclar o material utilizado nas próprias rodovias – o que pode ser feito com o auxílio das recicladoras. Elas cortam e trituram o revestimento já completamente deteriorado e o incorporam à base, às vezes com a adição de um ligante asfáltico, um aglomerante como o cimento Portland ou uma emulsão asfáltica. Assim é possível aproveitar o antigo revestimento e a parte da base sobre a qual um novo revestimento será aplicado.
 
O desenvolvimento de novas tecnologias na área de pavimentação se deve mais à necessidade de atender demandas de caráter ambiental ou a exigências de barateamento de produtos?

O melhor caminho é casar essas duas coisas. Tanto a necessidade de preservação ambiental quanto o apelo por bons negócios são muito fortes. Especificamente no caso da reciclagem de pneus e sua incorporação nos ligantes asfálticos, é grande o marketing feito em cima da questão ambiental. E com razão. Afinal, é louvável o fato de se conseguir um ligante de melhor qualidade a preços competitivos e, ao mesmo tempo, promover uma verdadeira faxina ambiental, já que os pneus – todos sabemos – são extremamente poluentes. 

Panorama desolador

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Trecho da BR-222, que liga Açailândia (MA) a Miranda do Norte (MA), em foto de 2004 (reprodução/CNT)

A Confederação Nacional do Transporte (CNT) divulgou nesta terça-feira, 20, o resultado da Pesquisa Rodoviária CNT 2005, o mais amplo estudo sobre as condições das rodovias brasileiras, que chega à décima edição. Durante 32 dias, 15 equipes de pesquisadores avaliaram as condições de conservação do pavimento, da sinalização e da geometria da via de 81.944 km de rodovias federais, estaduais e sob concessão, em todas as regiões do país.

O resultado da análise é desolador. Cerca de 72% da extensão pesquisada revelou algum grau de imperfeição, que varia de deficiente (32%), a ruim (22%) ou péssimo (18%). Em 2004, as equipes avaliaram 74.681 km de rodovias e constataram que cerca de 75% desse total apresentavam deficiências em seu estado geral.

As rodovias com gestão terceirizada obtiveram as melhores posições no ranking da CNT. O trecho que liga Limeira (SP) a São José do Rio Preto (SP) obteve a melhor colocação, conquistando a média geral de 98,4 (dos 100 pontos possíveis). Já o trecho que liga Belém (PA) a Guaraí (TO), administrado pelo governo federal, ficou em último lugar, com 40,3 pontos.

Com o objetivo de contribuir com o planejamento de políticas públicas e estudos sobre o tema, a CNT enviará o relatório da pesquisa a diversos órgãos ligados ao transporte rodoviário, como os governos federal e estaduais, o Congresso Nacional, ministérios, entidades sindicais, universidades e bibliotecas.

Roberto B. de Carvalho
e Célio Yano
CH On-line / PR
22/09/05