No rastro das aves

Tordo-do-bosque macho com seus filhotes (no alto) e fêmea de andorinha-azul (abaixo), ambos com um geolocalizador preso às costas (fotos: Elizabeth Gow/ Tim Morton).

Pela primeira vez, pesquisadores conseguem rastrear toda a viagem migratória de pássaros canoros que saem do Hemisfério Norte em direção ao sul antes do inverno. Esse trabalho era dificultado porque os animais são pequenos demais para serem rastreados por satélites e a obtenção de dados de seus movimentos se limitava a capturas isoladas e imagens de radar. O feito, realizado por um grupo canadense, só foi possível graças ao uso de um pequeno equipamento de localização preso nas aves.

Em 2007, a equipe, liderada pela bióloga Bridget Stutchbury, da Faculdade de Ciência e Engenharia da Universidade de York, no Canadá, prendeu pequenos aparelhos geolocalizadores nas costas de 14 tordos-do-bosque (Hylocichla mustelina) e 20 andorinhas-azuis (Progne subis), originários do estado da Pensilvânia (EUA). 

No verão de 2008, os pesquisadores conseguiram recuperar os aparelhos de cinco tordos e duas andorinhas. Eles então reconstituíram a viagem dos pássaros e descobriram seu local de permanência durante o inverno. Os resultados foram publicados na revista Science desta semana.

Os geolocalizadores, que têm o tamanho aproximado de uma moeda de dez centavos, detectam a claridade e, assim, permitem aos pesquisadores estimar a latitude e a longitude das aves no momento do nascer e do pôr do sol. Os dispositivos foram colocados nas costas e presos por pequenas tiras nas patas dos animais. O peso do equipamento incidia sobre a base da coluna dos pássaros, de modo a não interferir no voo.

Mais velozes
Os dados obtidos revelam que o desempenho dessas espécies era até então subestimado pelos pesquisadores: elas são capazes de percorrer distâncias muito maiores e voar mais rápido. Essas aves podem voar até 500 quilômetros por dia, três vezes mais do que estimativas anteriores. Além disso, na primavera, quando retornam ao Hemisfério Norte, os pássaros são capazes de voar de duas a seis vezes mais rápido do que no outono.

“No outono, uma andorinha demora cerca de 40 dias para viajar até o Brasil, mas demora apenas 15 dias para viajar de volta na primavera”, diz Stutchbury. “Ficamos espantados, pois acreditávamos que, para ela chegar de volta a sua casa em meados de abril, ela precisaria deixar o Brasil com muita antecedência.”

Voo com escalas

A bióloga Bridget Stutchbury libera uma andorinha-azul. Com os dados coletados, os pesquisadores conseguiram reproduzir a rota de migração desses animais durante o inverno no Hemisfério Norte (foto: John Tautin).

Segundo Stutchbury, as viagens no outono são mais demoradas porque os animais costumam realizar paradas mais longas. Com base nas estimativas, as andorinhas permaneceram de três a quatro semanas na Península de Yucatán, no México, antes de seguirem para o Brasil. Enquanto isso, os tordos ficaram duas semanas na região sudeste dos Estados Unidos, antes de atravessarem o Golfo do México rumo a Yucatán.

O estudo revelou ainda que a população de tordos-do-bosque não se separa durante toda a migração. Ao chegar ao destino final, os cinco animais analisados permaneceram dentro da mesma área, na parte leste de Honduras e Nicarágua. “Essa é uma região muito importante para os tordos, que tiveram sua população reduzida em 30% desde a década de 1960”, afirma Stutchbury. E alerta: “A população de pássaros canoros tem diminuído muito em todo o mundo nos últimos 40 anos.”

A bióloga destaca a importância da pesquisa não apenas para proteger espécies ameaçadas de extinção, mas também alertar para a necessidade de preservação dos ambientes tropicais. “Até agora, estávamos limitados, pois não sabíamos para onde essas aves iam; elas apenas desapareciam e retornavam na primavera”, comenta. “Seguir os pássaros até o local onde passam o inverno pode ser uma forma de prever o impacto da perda do hábitat tropical e das mudanças climáticas para essas espécies.”

Igor Waltz
Ciência Hoje On-line
12/02/2009