Nova cor, mais benefícios

Quem não quer ser mais saudável comendo o que gosta? Pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) conseguiram criar um tomate – o fruto mais popular do mundo – ainda mais nutritivo do que os já disponíveis no mercado, só que roxo.

Desenvolvido a partir do cruzamento de diferentes espécies da planta e de intensa exposição à luz, o novo tomate combina as propriedades da antocianina – pigmento que confere o tom arroxeado a uvas e ameixas e é um poderoso antioxidante – e do licopeno – responsável pela cor vermelha do tomate e também rico em antioxidante. 

Apesar de ainda estar longe das prateleiras, a novidade ajuda a consolidar uma técnica de cruzamento que é diferente da controversa transgenia, usada no desenvolvimento de outros alimentos – por exemplo, a soja e o milho –, no Brasil e em vários outros países.

A novidade ajuda a consolidar uma técnica de cruzamento que é diferente da controversa transgenia

O estudo, desenvolvido na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP) envolveu três espécies diferentes de tomate cultivadas no campo de pesquisa da própria instituição: duas selvagens (não comestíveis) e uma mutante. Esta última, além de ser supersensível à luz, tem em seu caule uma quantidade grande de antocianina, mas que não se reproduz naturalmente no fruto. 

Para transferir essa característica ao fruto, a equipe liderada pelo agrônomo Lázaro Eustáquio Pereira Peres teve que cruzar repetidas vezes a espécie mutante com uma das espécies selvagens de tomate – que conta com uma pequena quantidade de antocianina no fruto. 

Por meio da exposição das duas à luminosidade, os pesquisadores conseguiram provocar a biossíntese de enzimas produtoras do antioxidante na espécie mutante e, dos cruzamentos, obter uma nova planta – esta com antocianina no fruto.

Na etapa seguinte, outro cruzamento foi feito para homogeneizar a substância nas células do novo tomate. O processo foi o mesmo do cruzamento anterior, porém, dessa vez, a planta já modificada foi cruzada com a outra espécie selvagem, que contém uma quantidade maior que a normal de antocianina no caule. 

Segundo Peres, a antocianina e o licopeno fazem um trabalho complementar, embora a biossíntese dos dois seja completamente independente. “Após sintetizados, esses dois compostos acumulam-se em dois lugares diferentes da célula, a antocianina no vacúolo e o licopeno no plastídio.” 

O impulso britânico

Os estudos com o tomate roxo foram iniciados na Esalq em 2005, “em um ritmo lento”, conta o agrônomo. Mas, em 2008, quando pesquisadores do Centro John Inner, em Norwich (Reino Unido), conseguiram fazer um tomate roxo transgênico, Peres e equipe decidiram ‘dar um gás’ no trabalho que tinham começado. Em menos de dois anos o novo tomate já estava pronto.

A diferença das duas técnicas é que, no caso brasileiro, nenhum dos genes foi modificado, mas sim compilados para que juntos desenvolvessem algo novo. Além disso, o tomate roxo daqui tem mais vitamina C do que o britânico. Esse nutriente, fundamental para o ser humano, também é um antioxidante poderoso. 

O agrônomo afirma que precisamos ingerir cerca de 60mg de vitamina C por dia e 100g de tomate roxo brasileiro tem uma média de 50mg. “O bom do tomate é que ele é o vegetal mais consumido no mundo. Portanto, colocar mais antioxidantes nele significa tornar a dieta da população mais rica.”

tomate
O tomate é o vegetal mais consumido no mundo. Portanto, enriquecer suas características nutritivas e medicinais pode significar mais saúde para a população. (foto: Sxc.hu/ amyability)

Inviabilidade comercial

O tomate roxo pode ser considerado um alimento funcional, pois, além de nutritivo, pode ajudar a prevenir doenças cardiovasculares, diferentes tipos de cânceres e outros males relacionados à oxidação – processo em que os radicais livres destroem o DNA e a membrana celular.

Mas Peres ressalta que ainda não é possível comercializar o produto. “A gente faz isso em tomate não comercial, pois a planta que usamos é pequena e não é adaptada para o uso em larga escala”, explica.

“A gente faz isso em tomate não comercial, pois a planta que usamos é pequena e não é adaptada para o uso em larga escala”

Para chegar às prateleiras do supermercado, seria necessário que uma empresa investisse na adaptação do novo tomate a diferentes tipos de solo e à produção extensiva, um processo que, de acordo com os cálculos de Peres, levaria em média cinco anos.

Algumas empresas de melhoramento vegetal já mostraram interesse pelo alimento, mas, como são companhias estrangeiras, preferem, em geral, investir em pesquisas desenvolvidas no seu país de origem. “Tenho muitos amigos pesquisadores no exterior que me pedem a semente para ser desenvolvida lá fora”, conta o agrônomo.

De qualquer forma, as pesquisas continuam. Os agrônomos da Esalq seguem cruzando o tomate roxo com outras espécies para descobrir a forma mais eficiente de enriquecê-lo e a mais barata de comercializá-lo.

Fernanda Braune
Ciência Hoje On-line