Os computadores quânticos vão mudar nossas vidas. Se um dia puderem ser realmente construídos, é claro. A evolução – ou revolução – das máquinas foi tema da palestra do físico Ivan Oliveira, do Centro de Pesquisas Físicas (CBPF), apresentada na última sexta-feira (6/7), em meio às comemorações dos 30 anos do Instituto Ciência Hoje.
Para apresentar o maior sonho de consumo da ciência da computação nas últimas décadas, os chips quânticos, e debater as possibilidades de um futuro quase miraculoso, Oliveira promoveu uma viagem rápida pela história dos computadores. A criação da computação como área da matemática abstrata, o papel fundamental do Colossus no fim da Segunda Guerra Mundial, a revolução tecnológica representada pela criação do transistor, o desempenho do ‘poderosíssimo’ computador a bordo da Apollo 11 e o processo de miniaturização de seus componentes – tudo para alcançar o limiar de um futuro em que a computação e a física de partículas se emaranham.
Às portas do muito pequeno
À primeira vista, a abstração da mecânica quântica pouco tem a ver com a ciência da computação. E, no início, não tinha mesmo. Baseados inicialmente em válvulas e, a partir dos anos 1950, em transistores, os computadores sempre foram regidos pela física clássica. No entanto, o contínuo processo de miniaturização já era uma das premissas da chamada ‘lei de Moore’, postulada na década de 1970 pelo matemático Gordon Moore, que previa a duplicação do número de componentes nos chips a cada 18 meses.
De fato, entre 1970 e 2000, a quantidade de transistores por computador pulou de 2 mil para mais de 40 milhões, segundo Oliveira. A própria quantidade de átomos que compõem o transistor tem diminuído. “Se hoje ainda são constituídos por cerca de um milhão de átomos, no ano de 2020 serão necessários pouquíssimos”, afirmou o físico. “Esse processo de miniaturização conduzirá as máquinas às portas do reino do ‘muito pequeno’”.
Quando se mergulha em escalas tão minúsculas, os conhecimentos da física clássica dão lugar à mecânica quântica. Aí é que mora o problema – e a expectativa. Um dos primeiros a perceber isso foi o matemático Richard Feynman, que já se indagava, em 1985, como seriam computadores baseados na mecânica quântica.
Nas últimas décadas, a ciência vem buscando desenvolver essa nova geração de máquinas, baseada em bits quânticos (Qubits). Diferentemente dos bits ‘normais’, que representam informações assumindo valor 0 ou 1 a cada operação, os Qubits podem ter, ao mesmo tempo, os dois valores lógicos – propriedade explicada pelo fenômeno quântico conhecido como emaranhamento. “Isso abre possibilidades de processamento extraordinárias”, afirmou Oliveira. “Na teoria, computadores baseados em Qubits poderiam resolver problemas, que hoje levariam bilhões de anos, em questão de minutos.”
Quânticas possibilidades
O físico aponta uma série de novas – e bastante abstratas – possibilidades que seriam abertas com a concretização do computador quântico, dignas de ficção científica. Por exemplo, o teletransporte de dados (a transferência imediata de informações de um ponto para outro), formas de criptografia impossíveis de serem hackeadas – que já estão, inclusive, sendo utilizadas na prática – e até a simulação realista de sistemas físicos, químicos e biológicos. “Os computadores de hoje são incapazes de simular uma única molécula de água com toda sua complexidade”, explicou Oliveira. “Por isso, precisamos recorrer a muitas simplificações. O computador quântico permitira um estudo muito mais detalhado.”
Mas, então, por que estas máquinas miraculosas ainda não existem? Simples: porque ainda não sabemos como (e mesmo se é possível) construí-las. “Em laboratório, só conseguimos controlar sistemas que operem com cerca de 10 Qubits”, explicou Oliveira. “Para que todo esse potencial de processamento possa ser alcançado, seria necessário utilizar algumas centenas.”
Segundo o físico, apesar de já existirem diversos tipos de chips quânticos em teste, nenhum deles se aproxima do potencial esperado. Curioso é que, recentemente, a empresa canadense D-Wave anunciou a criação – e comercialização – do primeiro computador quântico, por uma ninharia de 10 milhões de dólares.
Oliveira admitiu que, apesar da desconfiança inicial da comunidade científica, a notícia ajuda a dar esperança para a busca sem fim pelo computador quântico. “Testes iniciais mostraram que o sistema da D-Wave obedece às leis da física quântica, mas não representa um ganho tão significativo em processamento”, afirmou. “Ainda estamos bem longe de atingir o potencial esperado, mas esse é um exemplo animador de que a computação quântica é possível.”
Marcelo Garcia
Ciência Hoje On-line