Novas soluções para uma velha conhecida

No Brasil, três mil novos casos de leishmaniose são registrados por ano, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS). A doença ainda é um problema nos chamados países subdesenvolvidos. Em áreas onde a leishmaniose é endêmica, é comum que os sintomas sejam notados primeiro em cães, grupo suscetível à moléstia.

Uma pesquisa realizada pela Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade Estadual Paulista (Unesp) pode dar origem a um novo tratamento para cães com a doença. Os pesquisadores testaram um novo fármaco fabricado no Brasil, chamado P-MAPA, e verificaram considerável melhora nos animais que receberam o medicamento.

Segundo a bióloga Valéria Félix Lima, coordenadora do estudo, foram selecionados 20 cães com leishmaniose visceral – que ataca principalmente os órgãos internos e tem alta taxa de mortalidade. Dos animais selecionados, 10 receberam o P-MAPA; e os restantes receberam placebo. Foram 45 dias de testes. Os cães medicados apresentaram notável melhora no quadro clínico. “A principal vantagem é que o fármaco não é tóxico”, afirma Lima. “Vimos também que, com o uso da droga, a carga parasitária diminui de maneira significativa.”

“A principal vantagem é que o fármaco não é tóxico. E, com o uso da droga, a carga parasitária diminui de maneira significativa”

A pesquisadora explica que a suscetibilidade do cão está ligada ao fato de que a resposta imunológica do animal não é tão eficiente no combate ao protozoário que causa a doença. Utilizar o P-MAPA trouxe bons resultados justamente porque o fármaco funciona agindo no sistema imunológico do cachorro. “O P-MAPA é uma droga imunomoduladora”, diz a bióloga. “Ela muda a resposta imunológica do cão; ele passa a eliminar o parasita.”

Lima explica que os cães funcionam como ‘animais-sentinela’. “Quando eles passam a apresentar sintomas característicos da doença, casos em humanos logo começam a aparecer”, afirma. Os animais sofrem com sintomas como emagrecimento progressivo; perda de massa muscular; perda de pelo; ferimentos na região do focinho e ao redor dos olhos e crescimento exagerado das unhas.

Opção auxiliar

No estudo, publicado no periódico Acta Tropica, os pesquisadores sugerem o novo fármaco como opção auxiliar no tratamento usual de cães com leishmaniose. Além de ter reduzido significativamente a carga parasitária, a droga não apresentou níveis de toxicidade nos cães medicados.

Lima acrescenta que a grande maioria dos medicamentos usados em cães não é voltada para a espécie e, por isso, é altamente tóxica para o animal. “Essas drogas melhoram os sintomas clínicos dos cães, mas afetam seu sistema hepático e renal e não eliminam o parasita da pele”, diz.

A bióloga acrescenta que, em pesquisas anteriores, o P-MAPA já havia mostrado vantagens no tratamento de tumores e doenças virais. A equipe pretende agora fazer um estudo comparativo com outras drogas.

Mosquito-palha
A leishmaniose é transmitida para cães e seres humanos pelo mosquito-palha. (foto: James Gathany/ CDC)

O sacrifício dos animais infectados era, até pouco tempo atrás, uma prática comum autorizada pela legislação brasileira. Segundo Lima, a medida não é efetiva justamente por não combater diretamente o real causador da leishmaniose. “A doença está em expansão no Brasil e o método de controle ainda é falho.”

Os primeiros casos surgiram no interior do Nordeste. Porém, atualmente, já são registradas ocorrências em todas as regiões do país.

Tratar os animais é um dos passos para a diminuição do número de casos de leishmaniose, considerada pela OMS uma doença negligenciada. Seu vetor, o mosquito flebótomo, mais conhecido como mosquito-palha, é o mesmo para cães e seres humanos. O combate a esse inseto é bastante difícil – pois esbarra na questão do saneamento básico, já que o mosquito se reproduz em áreas com grande acúmulo de material orgânico.

Fernanda Távora
Ciência Hoje On-line