Novo olhar sobre a sociedade brasileira

É preciso repensar a estrutura social do Brasil e o padrão de vida da população do país, que nem sempre está ligado à renda. Isso é o que indica uma nova metodologia de análise da estrutura de classes desenvolvida por um economista da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), como maneira de se interpretar a realidade sócio-econômica e ambiental do Brasil. Capaz também de estipular o grau de desenvolvimento social do país, a pesquisa pretende contribuir para reduzir as distorções geradas pelos indicadores de natureza quantitativa usados atualmente.

A proposta foi desenvolvida na tese de doutorado do economista Alexandre Gori Maia, orientada por Waldir Quadros. O objetivo era criar, com base nos dados gerados, uma nova configuração do espaço territorial brasileiro. A análise levou em conta três elementos básicos – a desigualdade social, a preservação ambiental e o crescimento econômico. Além disso, Gori ressalta que o desenvolvimento econômico deve ser pensado em conjunto com a preservação ambiental e com o bem-estar geral da população.

Ao aplicar esses indicadores à realidade brasileira, o economista chegou a resultados bem diferentes da divisão regional vigente. Com base em uma análise estatística, foram levantados os municípios com perfis mais próximos. Assim, transpareceram grandes disparidades sociais.

“Percebemos que os estados da região Sudeste apresentam discrepâncias entre eles, e também internas”, conta o economista. “Os municípios do Espírito Santo, em sua maioria, e os do norte de Minas Gerais estão bem mais próximos dos localizados na região Nordeste do que a maioria dos do Rio de Janeiro, São Paulo e do centro-sul mineiro.”

Outros desdobramentos
Um dos aspectos centrais da nova análise da estrutura da sociedade brasileira desenvolvida por Gori é a ocupação profissional de cada indivíduo, pois há casos em que profissões com alta remuneração não são as mais valorizadas socialmente. “Em muitos lugares, garçons têm salários superiores aos de muitos professores”, exemplifica o economista. “Contudo, socialmente, os professores possuem mais prestígio, pois são historicamente indivíduos com maior escolaridade, influência na sociedade e possuem um estilo de vida mais próximo ao da classe média.”

O poder político conferido a certas profissões também pode relegar a um segundo plano a importância da renda elevada na hierarquização social. De acordo com o economista, um indivíduo que ocupa um cargo de gerência com poder de delegar tarefas a subordinados, ainda que tenha salário inferior, muitas vezes goza de maior prestígio social do que outro em um cargo mais baixo, porém com salário maior. Dessa maneira, o prestígio social e o poder político criam organizações sociais que, em conjunto com a situação financeira, geram uma nova hierarquia dos indivíduos na sociedade.

Outra constatação foi que os municípios com uma maior participação da classe média na estrutura social são também aqueles onde há uma maior parcela de trabalhadores empregada no setor de serviços. ”Nesses lugares, percebemos uma estrutura social mais desenvolvida e complexa e também uma melhor distribuição da renda”, ressalta. Com isso, Gori inferiu que a desigualdade no Brasil é maior nos municípios pequenos e rurais – onde geralmente o poder político e econômico encontra-se concentrado nas mãos de poucos – do que nos de médio e grande porte, onde há uma classe média expressiva.

Crescimento sustentável
Embora se trate de um modelo teórico, Gori acredita na possibilidade de utilizá-lo, para, futuramente, serem criadas novas estratégias de planejamento de recursos que privilegiem os municípios mais atrasados e que ofereçam alternativas sustentáveis de crescimento, ao considerar uma estrutura social minimamente desenvolvida que seja capaz de se auto-sustentar economicamente.

A tese, apresentada para o Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Econômico, da Unicamp, despertou o interesse da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior do Ministério da Educação (Capes), que concedeu a Gori o Prêmio Capes de Teses em 2007, na categoria economia.   

Andressa Spata
Ciência Hoje On-line
25/02/2008