O desafio da reciclagem

As pilhas são objetos pequenos, comuns e de grande comercialização — só o Brasil produz cerca de 800 milhões por ano. Tóxicas, são comumente despejadas no lixo doméstico e encaminhadas para aterros sanitários onde, a céu aberto, entram em decomposição e liberam metais pesados no solo. Com o tempo esses elementos podem provocar danos irreversíveis ao meio-ambiente caso contaminem lençóis freáticos, a fauna e a flora e entrem na cadeia alimentar.

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Pilhas alcalinas e de zinco/manganês após seis meses
enterradas no solo a uma profundidade média de 40 cm

Com o objetivo de aprimorar técnicas de reciclagem de pilhas de forma econômica e ambientalmente sustentáveis, pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) desenvolveram um estudo sobre o reaproveitamento de pilhas usadas. O trabalho, publicado na edição de julho e agosto da revista Química Nova , descreve e analisa todas as etapas de reciclagem em escala experimental das pilhas comuns.

Pesquisador e professor do Instituto de Química da UFRJ, Julio Carlos Afonso explica que a reciclagem eficiente de pilhas ainda está longe de ser uma realidade no Brasil, onde o processo não é feito em escala industrial. A dificuldade de implementação de usinas de tratamento seria atribuída ao alto custo do reaproveitamento das pilhas. Como elas são multicomponentes, a desmontagem é muito complexa e o processo de reciclagem consome grande quantidade de energia.

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O desmonte manual permite separar os componentes básicos das pilhas: o
invólucro externo (papelão e plástico), a blindagem de aço, o copo de zinco,
o catodo e a pasta eletrolítica, que converte a energia química em elétrica

A equipe trabalhou com as pilhas de uso mais comum — as do tipo zinco/manganês (Zn/MnO2), ambos metais pesados. A partir do desmonte manual das mesmas, é possível separar seus componentes básicos (ver figura). O próximo passo descrito no artigo é o tratamento da pasta eletrolítica juntamente com o zinco, a partir da fusão com NaOH (hidróxido de sódio), seguida de dissolução em água.

São resultantes desse processo uma solução verde-escura de manganato e zincato de sódio, dióxido de manganês e óxido de zinco (ambos de interesse econômico), além de um resíduo líquido final salino incolor (sulfato de sódio) e um resíduo sólido insolúvel contendo mercúrio, ferro, níquel e chumbo.

Isso mostra que, embora o manganês e o zinco sejam os metais ativos no funcionamento das pilhas, outros metais pesados podem ser encontrados em pequenas quantidades, o que reforça a necessidade de reciclagem das pilhas. Uma resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente estabelece níveis máximos de mercúrio, cádmio e chumbo nas pilhas até os quais elas podem ser descartadas em aterros sanitários comuns. “Essa resolução é muito branda”, comenta Julio Afonso. “Não se trata de um material que possa ser descartado sem tratamento especial.”

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Pilhas antes da desmontagem diante de frascos
com os produtos resultantes do processamento no
Laboratório de Reciclagem e Resíduos da UFRJ

O pesquisador aponta que o desenvolvimento de técnicas de reciclagem será pouco eficaz se não houver um trabalho paralelo de conscientização. A separação das pilhas no lixo comum é um processo insalubre e faltam informações à população para que esse problema seja evitado.

“Estados como o Rio de Janeiro possuem leis que garantem a coleta seletiva de pilhas e baterias, mas, infelizmente, a quantidade recuperada ainda é pequena por falta de esclarecimento da população”, lamenta o professor.

 

 

 

 

 

 Leia na internet o artigo da equipe de Julio Carlos Afonso (formato PDF) e a
resolução do Conama que limita a quantidade de metais pesados em pilhas

Texto e fotos: Julio Lobato
Ciência Hoje On-line
13/10/03