O grande salto do sapo-cururu

 

O sapo-cururu ( Bufo marinus ) é uma espécie natural das Américas, onde ocorre do sul do Texas ao norte da Argentina. Tem 25 cm e pode pesar até 2 kg  (fotos: Ben Phillips).

Em 1935, os cerca de 100 exemplares de sapos da espécie Bufo marinus (popularmente conhecido no Brasil como sapo-cururu) levados do Havaí para a Austrália eram a salvação para as lavouras de cana-de-açúcar locais, castigadas por pragas. Mais de 70 anos depois, a situação se inverteu e ambientalistas lutam para combater esse anfíbio, que proliferou e já ocupa uma área de um milhão de quilômetros quadrados no país (mais do que a superfície do estado do Mato Grosso).
 
Pesquisadores da Universidade de Sidney revelaram em estudo publicado na Nature de 16 de fevereiro que a adaptação de tais sapos aos hábitats australianos representa um risco para animais nativos. Em entrevista à CH On-line , o coordenador da pesquisa, Richard Shine, explicou que a principal ameaça dessa espécie é o seu veneno. “Os predadores da Austrália comem esse sapo pensando se tratar de um animal não-venenoso, como todos os sapos do país”, conta. “A morte é imediata.”
 
De acordo com os cientistas, o Bufo marinus avança no território australiano a uma velocidade cinco vezes maior do que há 40 anos. Se na década de 1960 os sapos invadiam novas áreas numa média de 10 km por ano, atualmente eles percorrem até 50 km no mesmo período.
 
Os autores apontam no estudo um motivo por trás dessa aceleração na dispersão territorial: o crescimento das pernas do sapo invasor em relação aos primeiros espécimes que chegaram ao país. No estudo, eles verificaram que as populações de Bufo marinus mais antigas, fixadas no estado de Queensland, têm em média pernas que correspondem a 35% de seu comprimento. Já entre os sapos que estão na linha de frente da migração, essa porcentagem sobe para 45%.
 
Solução complexa

Shine monitorou sapos com coleiras ligadas a radiotransmissores e descobriu que aqueles com pernas maiores se movem mais rapidamente e percorrem distâncias superiores.

A tarefa de conter os sapos será complicada. “Diversas idéias já foram testadas, mas nenhuma funcionou. Controlar espécies invasoras sem causar mais problemas é algo incrivelmente difícil”, afirmou Shine. ”Pretendemos estudar profundamente a biologia do Bufo marinuspara que, dessa forma, seja possível desenvolver um método simples e ecologicamente viável que ajude no controle dessas populações.”

 
Caso nenhum método funcione, o pesquisador prevê dois finais bastante diferentes para essa situação. “Na pior das hipóteses, os sapos causariam a extinção de alguns predadores nativos. Logicamente, os efeitos para o ecossistema seriam terríveis.”
 
Porém, baseado em outros casos, Shine diz ser possível que a população de Bufo marinus decline sem a intervenção humana. “Por um motivo ainda desconhecido, a densidade populacional de espécies invasoras tende a diminuir após algumas décadas. Dessa forma, é difícil saber o que vai acontecer exatamente.”
 

O caso do sapo-cururu lembra o do coelho-bravo ( Oryctolagus cuniculus

), a espécie invasora que mais causou prejuízos na história da Austrália. Calcula-se que os fazendeiros australianos tenham perdido cerca de 600 milhões de dólares devido aos danos causados pelos coelhos às suas plantações e ao investimento na tentativa de extermínio da peste. Quando perguntado sobre pontos comuns entre os dois casos, Shine foi enfático: “O principal paralelo é a estupidez das pessoas em trazer esses animais que não pertencem à Austrália!”

 

 

Júlio Molica

 

Ciência Hoje On-line

15/02/2006