O remédio é dançar

A aula do professor Tales de Carvalho na Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc) começa de maneira convencional. Especialista em medicina e cardiologia do esporte, Carvalho leciona diante de um auditório, até que casais de dançarinos surgem no palco e transformam a aula em um espetáculo.

O show tem um propósito: mostrar como a hipertensão pode ser combatida com prazer. A dança é capaz de reduzir a pressão arterial do praticante verificada logo após a atividade. Segundo dados do Ministério da Saúde, a hipertensão atinge 35% da população brasileira acima de 40 anos.

A dança pode oferecer ao organismo os mesmos benefícios físicos que umexercício convencional, como uma caminhada rápida ou corrida

Um estudo conduzido por Carvalho, que também é médico, mostra que a dança pode oferecer ao organismo os mesmos benefícios físicos que um exercício convencional, como uma caminhada rápida ou corrida.

Carvalho avaliou os efeitos da dança como parte do tratamento de cerca de 80 pacientes do Programa de Reabilitação Cardiopulmonar e Metabólica da Udesc, que atende hipertensos, diabéticos, obesos e pessoas com problemas cardíacos.

Segundo o médico, os batimentos cardíacos dos pacientes quando dançam samba, bolero e forró costumam ser similares aos observados na prática de exercício na esteira ou bicicleta ergométrica.

Ele conta que, durante uma ‘aula-espetáculo’, um dançarino de 30 anos permaneceu com cerca de 160 batimentos cardíacos por minuto dançando tango e 175 batimentos por minuto dançando samba. Ao dançar rock, ele atingiu 197 batimentos por minuto – sua frequência máxima.

“No samba, a intensidade foi equivalente à de uma corrida longa”, compara Carvalho. E completa: “O ritmo mais exigente foi o rock, quando o dançarino atingiu batimentos cardíacos correspondentes aos de uma corrida curta de 200 metros em velocidade máxima.”

Menos pressão e mais “tesão”

Carvalho explica que a dança é um anti-hipertensivo natural muito eficaz. Ela libera no organismo óxido nítrico e outras substâncias com potente efeito vasodilatador, que reduz a pressão arterial.

Com a melhora da condição física, diminui a necessidade de consumo de remédios. “Além disso, a vasodilatação proporciona um efeito semelhante ao dos fármacos facilitadores do sexo”, acrescenta. “Isso significa menos pressão e mais tesão”, brinca.

Casal idoso dançando
Pacientes hipertensos que praticam dança são mais bem dispostos, tomam menos medicamentos e apresentam melhoras na função sexual e na qualidade do sono. (foto: Sebastián Dario – CC BY NC 2.0)

Segundo o médico, o sistema nervoso simpático também é favorecido pela prática da dança. Esse grupo de neurônios é responsável por estimular ações (como a aceleração dos batimentos cardíacos e o aumento da pressão arterial) que permitem ao organismo responder a situações de estresse.

“Há uma queda na produção do hormônio adrenalina e um aumento do hormônio endorfina, o que gera a sensação de prazer”, diz. E completa: “Mais prazer e autoestima elevada ajudam a afastar a depressão e a ansiedade, reduzindo a pressão.”

O médico destaca que a dança ainda tem a vantagem de estimular o convívio social, ao contrário das atividades individuais, o que proporciona mais prazer. “Trata-se de um exercício físico e mental, em um ambiente agradável, favorável à socialização e até à formação de casais entre os dançarinos”, analisa.

Vale destacar que, para conseguir bons resultados, os praticantes de dança que sofrem de hipertensão precisam ter uma alimentação saudável e evitar o consumo de álcool e de cigarros. “Se o paciente dançar regularmente e tiver bons hábitos, conseguirá mais energia, disposição, qualidade no sono e bom humor”, incentiva Carvalho.

Todos esses benefícios podem ser obtidos por qualquer pessoa, desde que seja escolhida uma forma de dançar adequada a sua condição. Carvalho ressalta que o correto é não se cansar em demasia e sentir-se confortável enquanto dança. “Dançar samba, frevo ou rock em alta intensidade não é para todos”, alerta o médico. “Além desses cuidados, basta escolher um bom parceiro para não levar um pisão no pé.”

Bruna Ventura
Ciência Hoje On-line