O significado das cores

Rebanho de caprinos pasta em fazenda experimental da Escola de Veterinária da UFPR. O rebanho caprino brasileiro é de quase 12 milhões de cabeças (foto: Marcelo Molento – Departamento de Medicina Veterinária / UFPR).

“Prevenir é melhor que remediar”, diz o dito popular, que é verdadeiro não só no sentido figurado. Com base no velho bordão, pesquisadores do Departamento de Medicina Veterinária da Universidade Federal do Paraná (UFPR) elaboraram uma espécie de manual de técnicas de manejo para criadores de ovinos e caprinos a fim de reduzir a contaminação dos animais e da pastagem. Trata-se de um conjunto de medidas de caráter preventivo, que procuram eliminar a necessidade de tratamento medicamentoso para todo o rebanho.

Idealizado pelo médico veterinário Marcelo Molento, o Sistema Integrado de Controle Parasitário (Sicopa) consiste em um conjunto de mais de 20 recomendações para reduzir a ocorrência de contaminações parasitárias em rebanhos de ovinos e caprinos. As instruções incluem desde a administração adequada de medicamentos até a mistura de animais de outras espécies no rebanho, uma vez que não há possibilidade de infecção cruzada (de uma espécie para a outra). O principal instrumento do Sicopa é o método Famacha, criado em 1997, na África do Sul, e trazido por Molento para o Brasil em 2000. Desde então o método passou a se disseminar pelo país.

A idéia é simples. O criador adquire um cartão plástico composto de cinco cores, que variam do vermelho ao branco. Ao comparar a cor da conjuntiva do olho do animal com as cores do cartão, ele pode estimar o grau de anemia causada por uma infecção parasitária. O vermelho (grau 1) indica que o indivíduo está saudável; o branco (grau 5) revela estado anêmico grave. “Animais que apresentem graus 1 e 2 podem ser selecionados, ao passo que os de grau 4 e 5 devem ser descartados”, explica Molento. Os de grau 3 requerem observação acurada.

À esquerda, animal saudável, com conjuntiva avermelhada (grau 1). À direita, animal anêmico (grau 5), com conjuntiva branca (fotos: Marcelo Molento – Departamento de Medicina Veterinária / UFPR).

O veterinário explica que a técnica serve para identificar a infecção por um nematóide específico, da espécie Haemonchus contortus. “Trata-se da maior causa de perda de rebanho no país, tanto de ovinos quanto de caprinos, representando entre 10% e 15% dos óbitos entre os animais”, relata Molento. Há registros de ocorrência do parasita em todo o mundo, independentemente do clima da região.

Oficinas para os criadores
A equipe do veterinário da UFPR conta com apoio governamental para promover cursos para criadores, que, após o treinamento, estão aptos a analisar o grau de enfermidade de aproximadamente 300 animais em menos de uma hora. Quase 3 mil pessoas já passaram pelas oficinas, realizadas em todo o país desde 2000.

Antes da adoção das técnicas de análise, os produtores necessitavam do auxílio de um especialista, o que, além de consumir mais tempo, eleva os custos de criação. Não bastasse isso, o uso de remédios para combater a parasitose prejudica o gado. “A constante aplicação de drogas antiparasitárias acaba por tornar os nematóides cada vez mais resistentes, obrigando o veterinário a usar doses cada vez maiores do medicamento”, diz Molento. Com a identificação de grupos de animais através do grau de infecção, o tratamento é seletivo, ou seja, só recebem droga aqueles que de fato necessitam. A redução no uso da medicação antiparasitária chega a 80% após a seleção feita com o auxílio do cartão de cores.

No Brasil, o rebanho ovino é de cerca de 16 milhões de cabeças e o caprino se aproxima de 12 milhões. A suscetibilidade à infecção pelo H. contortus é determinada geneticamente, isto é, varia de indivíduo para indivíduo. Separando os animais de acordo com a resistência ao nematóide, promove-se uma espécie de seleção artificial, da forma como o evolucionista inglês Charles Darwin (1809-1882) definiu, mas com intervenção humana. “Com o passar das gerações, qualquer rebanho tratado seletivamente será mais resistente ao parasita”, conclui o veterinário.

Célio Yano
Especial para a CH On-line / PR
28/01/2008