Objetos que se comunicam

Já pensou em um médico que monitora a pressão arterial de um hipertenso à distância e verifica, em tempo real, se o tratamento prescrito está adequado? E se a geladeira desse paciente lhe indicasse os alimentos mais (e menos) recomendados com base em sua pressão corrente?

Essas são algumas das potenciais aplicações da chamada Internet das Coisas (IoT, na sigla em inglês), cuja proposta é conectar objetos, entre si e com indivíduos, visando mais conforto, saúde, segurança e eficiência na vida das pessoas.

A IoT, que vem causando um certo furor nos meios tecnológicos, foi tema de um seminário realizado este mês na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), com a participação de pesquisadores brasileiros e britânicos envolvidos no projeto Casagras 2.

A iniciativa internacional, um dos principais esforços no campo, reúne vários países, inclusive o Brasil, e se dedica ao desenvolvimento de protocolos globais, a questões regulamentares e aos aspectos mais técnicos do movimento. 

A ideia é criar uma rede de comunicação entre objetos usando como base a plataforma da internet sem fio e a Identificação por Rádio Frequência

Segundo o engenheiro Ian Smith, coordenador do Casagras 2, a ideia é criar uma rede de comunicação entre objetos usando como base a plataforma da internet sem fio e a Identificação por Rádio Frequência (RFIDs, na sigla em inglês), um método de identificação automática que funciona por meio de sinais de rádio.

Para Smith, problemas cotidianos como o extravio de bagagens em aeroportos, más condições de pavimentação ou mesmo o gerenciamento inteligente do estoque de um supermercado podem ser minimizados com as aplicações da IoT.

No caso das bagagens, por exemplo, sensores nas próprias malas, nos aeroportos e nos aviões poderiam se comunicar e controlar a sua expedição, virtualmente eliminando as possibilidades de equívoco quanto ao seu destino.

O engenheiro José Roberto de Almeida Amazonas, da Escola Politécnica da USP e organizador do seminário, apresentou um trabalho de cientistas austríacos que mostra um supermercado onde o cliente tem como saber por quem, quando e onde o produto foi feito, se pode lhe causar alergia e até a sua pegada de carbono, entre outras informações. Tudo pelo celular.

Supermercados inteligentes
Supermercados inteligentes estão entre as potenciais aplicações da IoT. Neles, terminais com leitores de radiofrequência poderão informar detalhes sobre a data e o local de produção de um alimento, suas características nutricionais e até suas pegadas de carbono. (foto: reprodução)

Desafios à vista

De acordo com Anthony Furness, engenheiro da Universidade de Sheffield (Reino Unido) e coordenador técnico do Casagras 2, para que essas possibilidades se concretizem, é necessário aperfeiçoar as redes de comunicação e desenvolver novos e melhores métodos de Identificação por Rádio Frequência, que consumam menos energia e armazenem mais dados.

Além dos desafios técnicos, há as indefinições jurídicas. Um dos problemas a serem enfrentados com a aplicação dessa tecnologia é a falta de instrumentos legais internacionais que a regulamentem, já que não há fronteiras definidas no ambiente virtual.

Celular
A democratização dos celulares é fundamental para o êxito da IoT. (foto: Jakub Krechowicz/ Sxc.hu)

Outra questão colocada pelos especialistas diz respeito à inclusão digital, principalmente nos países em desenvolvimento. Segundo eles, para que o acesso à IoT seja tão amplo quanto desejado será preciso que haja uma democratização efetiva dos telefones celulares, essenciais nesse novo paradigma tecnológico.

Eles ressaltam ainda que as soluções para esses desafios devem ser pensadas em conjunto, mas as diferentes legislações dos países envolvidos e a falta de um instituto de referência ética dificultam o consenso sobre o que seria uma ‘cartilha de bom uso’ para essas novas possibilidades tecnológicas.

Oportunidade para o país

Ian Smith, que vem divulgando a iniciativa mundo afora, acredita que o Brasil pode desempenhar papel importante no desenvolvimento e nas aplicações da IoT, sobretudo no que tange à agricultura de precisão.

“O Brasil deve desenvolver sistemas de rastreamento e localização inteligentes na agricultura, entre outros usos da IoT”, pontua Smith. “Nós precisamos de parceiros e sem dúvida o Brasil tem um grande potencial.”

Rafael Foltram
Ciência Hoje On-line/ SP