Um artigo científico escrito a mais de 80 mãos. Essa é a proposta de três paleontólogos criadores do blogue The Open Dinosaur Project (em português, O Projeto Dinossauro Aberto). Nele, os autores compartilham as experiências da sua pesquisa e recrutam os leitores, leigos ou não, para contribuir com o estudo.
A ideia é que os voluntários ajudem a criar um banco de dados com as medidas dos ossos dos membros de locomoção dos dinossauros ornitísquios, ordem numerosa composta por animais herbívoros caracterizados pelo focinho em forma de bico e pela estrutura da bacia semelhante à das aves. Há várias questões por trás desse trabalho. Talvez a principal seja descobrir por que havia tantos quadrúpedes entre esses animais, como o estegossauro e o anquilossauro.
“Queríamos promover o conceito de ‘ciência aberta’ na paleontologia e que o grande público se animasse em fazer ciência ‘de verdade’”, explica Andrew Farke, coautor do blogue e curador do Museu de Paleontologia Raymond M. Alf, nos Estados Unidos. “Muitas pessoas estavam esperando essa oportunidade”, afirma em entrevista à CH On-line.
Os pesquisadores enfatizam que todos podem participar, mesmo que não tenham qualquer formação acadêmica na área. “Fizemos com que a oportunidade de contribuir fosse aberta a qualquer um, e seremos gratos àqueles que escolherem se juntar a nós”, convida Matthew Wedel, da Universidade Ocidental de Ciências da Saúde, nos Estados Unidos. “A resposta que o blogue teve até agora confirma a nossa suspeita de que o número de pessoas interessadas em fazer ciência não está limitado aos que têm diplomas avançados ou trabalham como cientistas”, opina.
Só no primeiro dia em que o projeto foi lançado, 30 pessoas demonstraram interesse em participar – e o número continua crescendo. Até o fechamento da matéria, o grupo – composto também por Michael Taylor, da University College London, na Inglaterra – já tinha 46 voluntários, segundo contagem feita por Andrew Farke.
Método colaborativo
Pelo bem da precisão do conteúdo do artigo, Farke, Wedel e Taylor montaram uma estratégia para a verificação e inclusão de informações. O voluntário deve baixar a folha de entrada de dados e preenchê-la com as medidas de espécimes presentes em artigos disponíveis tanto em bibliotecas quanto em endereços eletrônicos especializados em divulgação paleontológica (há uma lista disponível no blogue). Logo após, os dados e a referência bibliográfica devem ser enviados ao líder do projeto, Farke.
Feito isso, o internauta posta o nome do artigo e do espécime medido na lista de verificação, também disponível no blogue. Outro voluntário deve abrir a lista, escolher um animal cujos dados ainda não tenham sido validados e baixar o artigo correspondente. Depois que as medidas forem verificadas no artigo pelo segundo voluntário, este também deve enviá-las para o líder do projeto.
Para arrematar, Farke compara as duas anotações. Se não houver diferenças, ele lança os dados na planilha final. Se houver, ele lê o artigo do qual os dados foram retirados e os corrige.
Uma nova tendência?
Para Michael Taylor, a forma como a ciência é feita está mudando e é difícil prever aonde isso vai dar. Ele cita o exemplo dos blogues Chinleana, Paleo Errata e Sauropod Vertebra Picture of the Week, cujos autores são, respectivamente, os paleontólogos Bill Parker, Jeffrey Martz e o trio Matthew Wedel, Darren Naish e o próprio Taylor. Esses blogues são atualizados constantemente com artigos parecidos com os publicados na imprensa científica tradicional. A diferença é que os textos são mais curtos e têm linguagem um pouco mais coloquial.
Por enquanto, os artigos desses blogues são exclusivos. “Mas eu não diria que é impossível que publiquemos os textos formalmente em revistas tradicionais”, opina Michael Taylor.
Quando questionado sobre a possibilidade de o formato colaborativo com leigos se tornar frequente na elaboração de artigos científicos, Taylor é cauteloso. “É bom pensar que isso pode acontecer”, admite, “mas pode ser que o The Open Dinosaur Project seja o único desse tipo”. Ele acrescenta: “Espero que, a longo prazo, se as pessoas começarem a levar adiante trabalhos com colaboração em larga escala, possam aprender com nossos erros e fazer projetos cada vez melhores.”
Raquel Oliveira
Ciência Hoje On-line