Para onde vai a física de partículas?

O Grande Colisor de Hádrons, que está sendo construído em Genebra (Suíça), deve permitir novas descobertas para a física de partículas. No túnel acima, com 27 km de extensão, serão instalados os eletromagnetos supercondutores do acelerador  (foto: Juhanson).

Grande parte dos mistérios que envolvem a origem do universo podem ser desvendados quando for possível entender plenamente a estrutura da matéria. A iminente entrada em cena de uma nova geração de aceleradores de partículas e detectores promete responder várias perguntas essenciais sobre a origem da matéria ou o funcionamento do microuniverso. A cidade do Rio de Janeiro foi o palco em março de um evento internacional que reuniu alguns dos principais especialistas nessas questões, que discutiram as perspectivas do novo capítulo da história da física de partículas prestes a ser escrito.

 

Para esmiuçar o interior dos átomos, os físicos contam com os aceleradores de partículas, que permitem identificar cada um de seus componentes. Essas máquinas são usadas pelos físicos há quase 80 anos. Elas fornecem energia para as partículas subatômicas, o que imprime velocidade e causa colisões. Desses choques podem aparecer outras partículas que, apesar de surgirem e desaparecerem rapidamente, explicam os vários aspectos das interações fundamentais da natureza.

 

Esses equipamentos permitem não somente testar a validade do conjunto de teorias que descreve as forças fundamentais que regem o comportamento da matéria – o chamado modelo padrão –, mas também estudar novos fenômenos no nível fundamental do universo das partículas elementares. Atualmente, quase todos os aspectos desse modelo já foram confirmados. Todavia, ainda existem partículas importantes previstas pela teoria, mas que nunca foram observadas, devido a limitações tecnológicas dos aceleradores atuais. A mais importante delas talvez seja o bóson de Higgs, que os teóricos acreditam ser o responsável pela massa da matéria.

 

Nova geração

 

Os físicos depositam grande esperança na nova geração de aceleradores, que talvez permita a confirmação da existência dessa e de outras partículas. O primeiro deles a ser inaugurado será o Grande Colisor de Hádrons (LHC, na sigla em inglês), que começará a funcionar na Organização Européia para Investigação Nuclear (Cern), em Genebra, na Suíça, ano que vem. O LHC terá 14 TeV (tera-eletronvolts) de energia, ou quase quinze vezes mais do que o mais potente acelerador atual – o Tevadron, no Fermilab, situado em Batavia, Illinois, nos Estados Unidos, com 1 TeV.

 

O gráfico acima é uma representação hipotética do decaimento do bóson de Higgs em quatro outras partículas. Esse bóson é uma das poucas partículas subatômicas que foram previstas pela teoria mas ainda não foram observadas (imagem: Cern).

“O LHC será cerca de cem milhões de vezes mais efetivo na procura de partículas que o Tevadron – considerando, além da energia, outros fatores que influenciam a capacidade do acelerador”, disse Chris Quigg, físico do Fermilab, em entrevista à CH On-line

. “Não sabemos o que iremos encontrar na escala de energia de 14 TeV, se será o bóson de Higgs ou outra partícula. O fato é que encontraremos alguma coisa que vai responder às nossas perguntas ou vai provar que a teoria está errada.”

 

Essas questões foram discutidas durante a Escola Internacional em Física de Altas Energias (LISHEP 2006), realizada na Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Quigg fez uma palestra sobre o futuro do Fermilab e os planos de construir outro grande acelerador de partículas, o Colisor Linear Internacional (ILC).

 

“Essa nova máquina irá complementar o trabalho do LHC. No fim deste ano provavelmente teremos um planejamento de como será o acelerador e quanto ele vai custar”, disse. A principal diferença entre os dois equipamentos é que o ILC será linear, ao contrário do LHC e do Tevadron, que são circulares. Além disso, o ILC é um colisor elétron/pósitron (partículas com as mesmas características do elétron, mas com carga elétrica positiva). Já o LHC é um acelerador próton/próton, no qual as partículas que colidem são apenas prótons.

 

“Instrumentos diferentes podem encontrar partículas diferentes. Esses dois tipos de aceleradores são duas maneiras de ver o mundo”, defendeu o pesquisador.

 

Física de partículas no cotidiano

 

Pode até parecer, mas essa tecnologia não está tão longe da sociedade quanto se imagina. A física de aceleradores ajuda a desenvolver áreas da computação, da eletrônica e da engenharia, por exemplo. “É importante disponibilizar a tecnologia que criamos o mais rápido possível para as pessoas” disse em entrevista à CH On-line

Marilena Streit-Bianchi, pesquisadora do programa Transferência de Tecnologia do Cern, que também participou da LISHEP 2006. “Para que isso aconteça, a indústria precisa entender o que pode ser feito com as técnicas desenvolvidas pelos pesquisadores. Apenas uma comunicação direta torna isso possível.”

 

“Estamos procurando coisas que são bilhões e bilhões de vezes menores que qualquer coisa ao nosso alcance visual e precisamos criar instrumentos que respondam a esse desafio. Muitas vezes os conhecimentos adquiridos no desenvolvimento dos aceleradores são usados para desenvolver tecnologias que vemos no cotidiano”, completou o professor Chris Quigg.

 

 

 

Franciane Lovati

 

Ciência Hoje On-line

11/04/2006