Pequena grande solução


Um terço dos peixes capturados em mares e rios de todo o mundo destina-se à alimentação de peixes de grande porte em criadouros. Mas essa realidade está prestes a mudar graças a uma alternativa apresentada pela empresa Imcopa, maior produtora e exportadora de derivados de soja não-transgênica do mundo, sediada em Araucária (PR). A partir de microalgas marinhas, a empresa fabricará um óleo rico em ômega-3 e ômega-6 para alimentar peixes nobres em cativeiro.

Tanques de criação de microalgas em laboratório da Universidade Federal do Rio Grande (foto: Furg / divulgação).

Até agora, espécies nobres como salmão, truta e bacalhau obtêm esses ácidos graxos da ração que comem, feita em parte com óleo e farinha de peixes menores, como anchovas, manjubas e sardinhas. A outra parte é de óleo vegetal.

“Para alimentar um único quilo de salmão, são necessários dois quilos de peixes menores”, exemplifica o engenheiro de pesca Osires de Melo, responsável pelo projeto, feito em parceria com a Universidade Federal do Rio Grande (Furg), no Rio Grande do Sul.

Em todo o mundo, peixes nobres de cativeiro – além de aves e suínos, em menor escala – consomem mais do dobro de alimentos de origem pesqueira que os japoneses e seis vezes mais que os norte-americanos, segundo dados do projeto ‘O mar ao nosso redor’, desenvolvido pela Universidade da Columbia Britânica, em Vancouver, Canadá, juntamente com a organização não-governamental norte-americana The Pew Charitable Trusts.

O projeto brasileiro, com o apoio da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), começou a ser desenvolvido em maio de 2008, com previsão de concluir-se em três anos. “No momento, criamos meios de alimentar as microalgas e de propiciar um ambiente adequado ao seu crescimento e à sua reprodução”, conta o engenheiro de alimentos Jorge Alberto Vieira Costa, responsável pela parte do projeto desenvolvida na Furg. “No final do trabalho, esperamos extrair ácidos graxos poli-insaturados dos tipos ômega-3 e 6 das algas e adicioná-los ao farelo e óleo de soja.”

Prevenção e mitigação de doenças
Os pesquisadores esperam também poder enriquecer o óleo de soja para consumo humano com esses ácidos graxos. Essas substâncias têm papel essencial na nutrição não só de peixes, mas também do homem. Além de atuar na formação de tecidos neurais, previnem e mitigam doenças, como as cardiovasculares, reumatismo, câncer e doença de Parkinson.

Microalgas são testadas em laboratório da empresa Imcopa, em Araucária (PR): solução sustentável para alimentação de grandes peixes em cativeiro (foto: Fábio Riesemberg).

Na microalga unicelular há entre 15% e 70% de óleo, do qual até 40% são ômega-3 e 6. Cinco espécies (três brasileiras) dessas microalgas ricas em ácidos graxos estão sendo estudadas, e os aspectos positivos impressionam.

A capacidade dos peixes de digerir esse produto de origem vegetal é de 90% (nenhum outro alimento alcança esse patamar). Isso reduz a quantidade e a toxicidade das fezes do animal lançadas na natureza. Enquanto um hectare de soja rende 600 litros de óleo por ano, um hectare com tanques de microalgas (com profundidade de 30 cm a 40 cm) pode fornecer no mesmo período até 120 mil litros.

Há ainda economia de água doce, já que as microalgas utilizadas requerem apenas água salgada ou salobra para crescer. Além disso, esses micro-organismos, no processo de fotossíntese, retiram gás carbônico da atmosfera e liberam oxigênio. “A produção do óleo a partir de microalgas é, portanto, uma alternativa limpa e sustentável”, salientam os pesquisadores.

Ameaça aos oceanos
O fato de 37% das capturas mundiais de peixes marinhos e fluviais se destinarem à alimentação de peixes maiores em criadouros é apontado como um problema que agrava a pesca predatória nos oceanos, afirma Costa. O tema tem sido alvo de intensos e acirrados debates.

“A ração de peixe contém óleo de animais de pequeno e médio porte, como a anchova, a sardinha e o escamudo, que são o principal alimento do oceano para o ser humano, para peixes de grande porte e para mamíferos e aves marinhas”, explica o pesquisador.

Segundo Costa, as espécies retiradas dos mares em larga escala são de baixo valor comercial e, em vez de suprir as necessidades alimentares de inúmeros animais e do próprio homem, acabam se destinando quase só à produção de ração. “Com o desenvolvimento do projeto, essa realidade perversa pode alterar-se radicalmente”, conclui o engenheiro da Furg. 

Luan Galani
Especial para CH On-line/ PR 
03/02/2009